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quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Que curso fazer para ser profissional da tradução

Me escreve uma jovem, interessada em ser tradutora, pedindo orientação. Perguntando que faculdade fazer, essas coisas. A pergunta é freqüente e vou responder mais uma vez por aqui, assim, pode ser útil para mais alguém.

Para ser tradutor, a rigor, você só precisa da cara e da coragem. Qualquer um, no Brasil e em qualquer país do mundo, pode pendurar uma tabuleta na porta dizendo "Fulano de Tal, tradutor". Em muitos países, há cursos de tradução, e em alguns deles os cursos são muito bons e prestigiados; em nenhum são obrigatórios. Por isso, por exemplo, na Alemanha se distingue entre Diplomübersetzer, que é o diplomado, e Übersetzer, que não tem diploma. Mas ambos podem exercer a profissão e a exercem.

Um curso superior, entretanto, ajuda muito, principalmente se for superior não só no nome, mas também na qualidade — e no empenho que você tiver nos estudos, porque fazer curso superior tomando chope com os colegas no boteco da esquina e reciclando trabalhos dos veteranos não ajuda muito.

Um bacharelado em letras é uma grande opção. Se conseguir um bacharelado em letras-tradução, melhor ainda. Se não for em letras-tradução, provavelmente vale a pena investir em um curso livre de tradução, como complemento. Ou em uma especialização em tradução. A especialização em tradução também é recomendável para quem se graduou em alguma área que não letras.

Quer dizer, se você fez direito e, depois, descobriu, como vários colegas nossos, que ama a ciência do direito, mas detesta as opções profissionais abertas ao bacharel em direito e prefere se dedicar à tradução, faça um curso de especialização em tradução ou um curso livre. Este, talvez, seja o melhor dos mundos, porque você já sai "especialista" em direito. Por outro lado, agüentar cinco anos de faculdade de direito, quando o que você quer sempre foi traduzir, pode ser um fardo insuportável.

Há muitos tradutores que não têm curso superior em letras. Entretanto, embora seja esse o caminho que eu próprio segui, não recomendo a ninguém. A norma é: quer ser tradutor, faça curso de letras.

Dois breves conselhos finais: Primeiro, não se esqueça de que é você quem faz o curso, não o curso que faz você: estude, estude e tenha certeza de que, por mais que estude, não estudou o suficiente. Segundo, para cada hora de língua estrangeira que estudar, estude duas de português. É assustador número de tradutores e candidatos a tradutor que conheço que exibem, orgulhosos, seu excelente inglês, mas traduzem para um português canalha.

Escrito por Danilo Nogueira, com revisão, muita colaboração, palpitação geral e puxões de orelhas de Kelli Semolini.

14 comentários:

Anônimo disse...

Concordo, Danilo, que uma faculdade de letras é o mais recomendado para quem quer ser tradutor, mas somente por falta de opção melhor... Eu mesmo sou formado em letras, mas de lá não veio quase nada que me ajudasse na prática de traduzir. O negócio é que 1) Aprender a escrever Português não é objetivo de uma faculdade de Letras, mas do ciclo escolar 2) Não se aprende língua extrangeira na faculdade; 3) Os estudos de letras tendem a ser ou literários, ou lingüísticos("científicos" por tanto), não abrangendo nada de "técnica", seja para tradução, seja para qualquer outra coisa.
Bom, estou pensando principalmente nos bacharelados das universidades públicas, mas andei observando também uns programas de universidades particulares e me parecem ainda mais desfalcados, principalmente os cursos de letras/tradução, geralmente rasos demais. Sei lá, que se faz?

Danilo Nogueira disse...

Percino, obrigado por seu comentário. Você toca num ponto nevrálgico, que são as deficiências do nosso ensino.

Tenho um comentário específico sobre o ponto (2), porque a reclamação de muita gente que eu conheço é justamente de que entrou na faculdade já sabendo uma língua estrangeira e se infernizou com o professor começando do bê-a-bá, porque os alunos mal sabiam o absolutamente fundamental.

Por outro lado, conheço gente que entrou na faculdade já sabendo bem uma língua estrangeira e pegou um professor dos bons, que ensinou o bê-a-bá com uma profundidade tal que valie a pena até para quem já sabia.

Quer dizer, há faculdades e faculdades, como há professores e professores, alunos e alunos. A escolha é muito difícil.

Não é o caminho perfeito nem o sucesso é garantido, mas quem estudar com garra sai no lucro.

Danilo

Kelli Semolini disse...

Percino,

Todo curso é desfalcado. Claro que em Letras não há nada sobre tradução em si. Eu tive sorte de ter uma optativa sobre tradução, porque normalmente não tem mesmo.

Não se ensina língua estrangeira em universidade simplesmente porque não é o objetivo. Para isso, existem N escolas de idiomas por aí. O objetivo de um curso universitário de Letras é formar profissionais do(s) idioma(s). POrtanto, o ideal seria que todos os alunos entrassem no curso já com um conhecimento razoável do idioma a ser estudado. Nem sempre é possível, eu sei. ainda tem os casos de línguas mais raras, como o latim, o grego, e na USP tem até sânscrito. Não tem como, mesmo. Aí, o caminho fica um pouco mais árduo, é verdade, mas não por isso impossível.

Do mesmo modo, não se ensina a escrever no curso de Letras porque espera-se que quem esteja lá já saiba escrever. O que se faz lá é polir essa habilidade, para que o aluno saia de lá um profissional do idioma, em geral, um professor. Para isso, repare no tanto de ferramentas e de conhecimento que você pode obter nas aulas de Lingüística e de Literatura. Qualquer aluno minimamente dedicado aprende muita coisa sobre a língua, principalmente o português, nessas aulas.

Quer dizer, aprender a traduzir, num curso de Letras, ninguém vai. Mesmo num curso universitário de Tradução, ninguém aprende se não se dedicar. Mas você adquire um traquejo para lidar com os idiomas que dificilmente se aprende em outro lugar. Quer dizer, você tem a possibilidade de fazer tudo isso. Depende do curso ser bom, sim, mas depende muito, também, do tanto que você resolve estudar FORA da sala de aula. Como já me disseram quando entrei na UNESP: aprende-se muito na universidade, sim, mas muito mais fora da sala de aula que dentro dela. Do mesmo modo aprende-se a traduzir traduzindo. E estudando muito.

Kelli

Thiago Percino disse...

Tem toda razão, Danilo: há casos e casos. E ainda somam-se aos desfalques (já rotineiros) do nosso ensino, as complicações específicas do ensino de línguas - que é muito menos óbvio do que ensinar, por exemplo, geometria. Não é apenas a razão lógica que se detém no aprendizado de uma língua, mobiliza-se um número infinito de recursos psicológicos, afetivos, etc.

*

É verdade, Kelli, o estudo da Literatura e da Lingüística contribuem muito para desenvolver conhecimentos de língua, contribuem mesmo. A questão é que a maior parte dessas contribuições são colaterais, não fazem parte do objetivo do curso. Em todo caso, é a única coisa que se tem. Que fazer? É o mesmo caso do físico e do jogador de futebol: o primeiro pode entender todo processo do jogo, decompor as trajetórias, deduzir velocidades, analisar mil e uma características previsíveis, tudo isso sem saber dar um olé. A tradução é uma técnica, mais do que um saber abstrato, e uma técnica que não pressupõe como carga teórica nada mais do que o conhecimento prático de duas línguas ou mais e uma boa dose bom senso. O resto é experiência.
Em todo caso, sendo as contribuições colaterais ou não, são elas muito bem vindas. E vale a pena, sim, fazer um curso de Letras, não quis dizer o contrário. Só não se deve esperar aprender lá a bendita técnica de traduzir.

Detalhe, Kelli, você citou exatamente as línguas que eu fiz: Latim, Grego e um pouquinho de Sânscrito. Que terror! Abraços!

Kelli Semolini disse...

Thiago, mas que doido!

No fundo, dissemos a mesma coisa: não se aprende a traduzir no curso de Letras. Para dizer a verdade, quando estava revisando, palpitando e puxando a orelha do Danilo (:)), eu comentei com ele que às vezes sinto que seria mais fácilo ter feito uma faculdade qualquer, fosse química, engenharia, direito, medicina, porque aí o nicho já está pronto. Quem faz letras fica um tempo à deriva, até se especializar.

Kelli

Anônimo disse...

Danilo, obrigada por esclarecer algumas dúvidas que eu tinha.
Acho que vou acabar fazendo Letras - Língua Inglesa e Respectivas Literaturas, aqui em Londrina mesmo. Entrei no site da universidade e vi as matérias de cada semestre/ano, vi que é um curso bem conceituado pelo MEC, mas ainda não to totalmente decidida.
Eu não acho que o dinheiro seja a coisa mais importante de uma profissão, mas não quero fazer um curso só por fazer. Já que tenho oportunidade de fazer uma faculdade, quero algo que tenha um retorno.
Ainda to em dúvida quanto a profissão a seguir, porque gosto muito de línguas, de ler e escrever, mas a Odontologia também chama a minha atenção. Sempre quis fazer uma faculdade (bem feita, claro!) e sempre tive a certeza de que queria Odonto, mas hoje não sei mais, por isso to correndo atrás de informações de outros cursos, e gostei muito da tradução. To insegura ainda pra escolher outro curso, e aqui pude esclarecer umas dúvidas que eu tinha.
Obrigada!!

robertobech disse...

Eu não sei qual foi a faculdade de Letras que o amigo Percino fez, mas a minha me ajuda um bocado com a tradução.

As aulas de inglês e literatura inglesa já eram, logo de cara, em inglês. Quem não sabia inglês que corresse atrás. As aulas de inglês eram bastante técnicas, nada de "vamos aprender inglês", o que não significa que os "atrasaldinos" tinham que ficar boiando.

Logo no primeiro período fiz amizade com uma menina que não tinha um inglês bom. Ela ficava perdida, mal conseguia formar uma frase, mas sempre tentava. Gaguejava, a turma ficava impaciente porque a aula parava. Mas a danada era esforçada para diabo, correu atrás e se formou como uma das melhores alunas da sala. Mas estou fugindo do assunto...

Aprendi a traduzir na faculdade? Não. Mas o pouco que se estuda sobre grego e latim por lá, o baita conhecimento que você adquire sobre literatura inglesa (e conseqüentemente sobre a cultura dos países de língua inglesa) e o nível de aprofundamento no estudo de sintagmas e outras coisas igualmente divertidas preparam um belo terreno para você erguer sua cabaninha mais tarde.

Anônimo disse...

Adorei este post, pois quando entrei na Unibero (curso de T.I.), minha principal dúvida era se o curso em si era necessário e se me auxiliaria. Bem, acho que se a pessoa gosta de português é ótimo fazer letras-t.i.!
Enfim, ótimo post!
Abraços, Yasmin.

Anônimo disse...

olá Danilo.
veja só: sem querer, via Google, me deparei com seu blog.
na verdade não sou um profissional de tradução/interpretação. mas lido com documentos em inglês na empresa em que trabalho, e freqüentemente tenho que recorrer a dicionários (em papel ou online) e sites de tradução, e até mesmo ao Google, para achar os significados de algumas expressões dos mercados financeiro e de tecnologica da informação, nos quais a empresa em que trabalho está inserida.
hoje pude tirar uma dúvida crucial ao ler seu post sobre "quotaholder". já tasquei no meu documento a expressão shareholder no lugar daquela, que vinha sendo usada há tempos.
obrigado e parabéns pelo trabalho.

Anônimo disse...

"Quer dizer, se você fez direito e, depois, descobriu, como vários colegas nossos, que ama a ciência do direito, mas detesta as opções profissionais abertas ao bacharel em direito e prefere se dedicar à tradução, faça um curso de especialização em tradução ou um curso livre."

Incrível como você conseguiu, em tão poucas palavras, dizer o que eu jamais consegui explicar a ninguém, Danilo. Essa minha relação de amor e ódio com a engenharia sempre esteve muito bem-definida dentro da minha cabeça desde que eu resolvi ser tradutora, e mais ainda agora na pós. É difícil as pessoas entenderem que eu resolvi fazer a pós não foi para passar o tempo; a minha intenção é viver de traduzir e traduzir por muitos e muitos anos. E eu quero melhorar sempre.

Excelente post. Quisera eu ter lido isso uns 3 anos atrás. heheh

Um abraço.

Anônimo disse...

Olá!
Antes de mais nada, gostaria de agradecer pela disposição em esclarecer os caminhos da tradução. Para pessoas como eu, isso é de extrema importância.
Por pessoas como eu, pode-se entender a estudante de Direito que não tem nenhum amor pelas diversas áreas de atuação que o curso oferece. Durante a faculdade, descobri que tenho verdadeiro amor por línguas. Mas não sei bem como trabalhar com isso. A tradução foi um dos caminhos em que eu pensei. Eu gostaria muito de fazer traduções de livros, mas não faço idéia de como esse mercado funciona. Dei uma olhada em sites de agências de traduções, mas nenhuma das que eu vi tem como clientes editoras.
Alguém saberia como as coisas funcionam nessa área? E quais as exigências relativas aos tradutores?
Eu agradeceria muito pela ajuda.

Danilo Nogueira disse...

Oi Gabi, acho que você está algo confusa. A ver se consigo melhorar as coisas. A boa notícia para você está no fim desta resposta. Tenha paciência.

Editoras geralmente contratam tradutores diretamente. Quer dizer, a maioria das editoras não procura agências. Então, quem quer traduzir para editoras, não procura agências.

Por outro lado, o que se traduz de livros jurídicos é muito pouco. Como os ordenamentos mudam de país para país, o que pode ser uma grande maravilha nos EUA não tem pé nem cabeça no Brasil, ao contrário do que acontece com engenharia e medicina, por exemplo, onde os livros importados muitas vezes são os que trazem as novidades mais importantes.

A boa notícia está em que existe muita tradução jurídica nestes Brasis e grande parte dela feita por intermédio de agências. E a quantidade de tradutores que sabe enfrentar jurídica é muito pequena, bem menor que a demanda do mercado. Não vou dizer que você vai ligar amanhã para uma agência e tornar-se financeiramente independente em 24 horas, mas oportunidades é que não faltam. Por outro lado, note bem que saber línguas é simplesmente necessário para traduzir, mas nem de longe suficiente. Ao pegar o primeiro serviço é que você vai ver que a briga é boa.

Mas, claro, que corre de gosto não cansa.

Anônimo disse...

Obrigada, Danilo!!!
De fato, eu considerei tradução de textos jurídicos, sim. Pensei em tradução juramentada para não desperdiçar o que eu aprendi na faculdade. Mas isso seria uma atividade paralela.
Meu maior interesse seria a tradução de livros, livros em geral. Não diria que estou ambicionando traduzir Shakespeare(quem sabe um dia, né?), mas ficaria contente em fazer tradução de best-sellers(imagino que aqui a concorrência deve ser insana.
Quanto à atividade em si, eu dei uma boa lida no seu blog e entendi que não basta ser mero conhecedor. Estou pensando em fazer o curso de tradução do Alumni para ver se eu tenho alguma chance na área e, se der certo, pensei em procurar outras formas de me especializar.
De qualquer forma, a sua resposta ajuda a minha dúvida. O negócio é ir para as editoras diretamente.
Vou abusar só mais um pouquinho da sua paciência com mais uma pergunta, ok? Digamos que tenho trabalho com editora já bem consolidado, tenho um currículo muito decente e experiência. É possível manter as relações de trabalho aqui, morando fora do país?
Obrigada de novo pela ajuda!!!

Unknown disse...

muito obrigado pelo texto informativo, eu comecei faculdade a já um tempo e desejo ser tradutor mas a quantidade de matérias de português estava me incomodando muito mesmo eu não tendo problemas por enquanto com elas, eu tava sendo cabeça dura e dizendo q elas não eram importantes porque eu queria ser tradutor e seu texto me ajudou a esclarecer várias dúvidas.