Escreveu a Tamara:
Sou estudante de Letras, estou em meu 1° ano na Unesp/Assis e já no final deste 1° semestre devo optar por qual língua estrangeira estudar até o final do curso. O caso é que eu quero ser tradutora e isso está influenciando na escolha do idioma. Gosto muito mais do espanhol do que do inglês, mas o senhor acha que há muitas oportunidades para a tradução em língua espanhola como há para o inglês? Gostaria muito de trabalhar traduzindo novelas e filmes português/espanhol e vice-versa, sei que essa não é a área na qual o senhor atua, mas o senhor tem mais noção disso do que eu e poderia me ajudar a esclarecer essa dúvida que tanto me atormenta! (não estou exagerando!).
Tamara, só para argumentar, vamos imaginar que "espanhol" e "inglês", no se caso, não sejam línguas, mas sim as nacionalidades de dois de seus pretendentes. Você pode casar com um ou com o outro, ambos são legais, mas você gosta muito mais do espanhol do que do inglês. Entretanto, no momento parece que o inglês tem um futuro profissional mais brilhante.
Você está perguntando com qual dos dois deve casar. Porque a gente, de certo modo, casa com a língua que traduz, convive com ela e seus falantes, visita o país onde ela é falada, lê jornais e livros escritos nela, essas coisas. Você estar abraçada com o inglês, vendo aquela assanhada da sua maior inimiga toda agarrada com o espanhol, é um sofrimento.
Pior: essas coisas profissionais mudam, Tamara. E, da mesma forma que o espanhol pode ganhar numa loteria qualquer e ficar podre de rico, o inglês pode dar um azar desgraçado na vida, entrar em depressão e estar um trapo de marido aos trinta anos, fazendo a infelicidade da terceira mulher. Prever o futuro é impossível.
Falando do ponto de vista estritamente profissional, o mercado de inglês é maior que o de espanhol, mas também tem muito mais tradutores. Isso significa que quem é realmente bom, tem iguais chances de se profissionalizar tanto no inglês como no espanhol. Realmente, não vejo problema e tenho muitos colegas de espanhol que estão lotados de serviço. Acabou aquela ideia de que "espanhol todo mundo sabe e qualquer um traduz". Felizmente - e não me parece que isso tenda a mudar.
Dois comentários finais, para você e para todos os que lerem este artigo:
Primeiro, que, dada a preeminência da TV e do cinema na nossa cultura, onze entre cada dez tradutores iniciantes ou pretendentes a tradutor esperam traduzir filmes, novelas e quejandos. Não estou dizendo que você, especificamente, não consiga chegar lá. Mas cabe dizer que essa é uma fração do mercado e o grosso do serviço, em qualquer par de línguas, é constituído por tradução pragmática (comercial, técnica, jurídica, médica…), em qualquer país do mundo e em qualquer época da história. A tradução de filmes e coisas assim aparece muito e está crescendo, mas ainda representa e, creio, vai sempre representar, um volume menor que o da pragmática. Mais de 90% dos tradutores jamais traduziram um filme ou literatura na vida. Eu nunca fiz nada disso e estou satisfeitíssimo com a profissão. Preciso escrever alguma coisa sobre esse assunto, um dia desses.
Segundo, que para ser um bom tradutor, aprender a língua estrangeira é essencial, mas nem de longe o suficiente: é igualmente importante dominar a própria língua. Você escreve bem, Tamara, mas, como tradutora, vai ter de aprender a virar o português do avesso, porque vai ter de adaptar o seu português "natural", o jeito que a Tamara escreve, para o estilo do original, que pode ser muito diferente do seu. E, se você se dedicar ao espanhol, o problema é piorado pela semelhança entre as línguas: quanto mais semelhantes as línguas do seu par, maior a chance de contaminação. Quer dizer, estude espanhol como louca e português como louca e meia.
E, assim, você chega lá.
Ah, prefiro ser chamado "Danilo", mesmo, sem "senhor". Por favor.
5 comentários:
Oi Danilo. Lendo o comentário da Tamara aqui, lembro-me de perguntar sobre as línguas clássicas. Na verdade, durante as minhas pesquisas, nunca ouvi falar algo sobre o mercado do grego e do latim.
Li em algum lugar, não me recordo agora, que só há a possibilidade de escolher um "pacote", digamos assim, de línguas na faculdade, ou Línguas Clássicas ou Línguas Modernas. O senhor(desculpe chamá-lo assim,uma vez que vi o que escreveu sobre isso nesta mesma postagem, mas é um hábito meu)poderia informar se não há meios de estudar essas línguas em conjunto, como por exemplo, grego-inglês?
O mercado para as línguas clássicas é exíguo, Gerlane e acho que cursos só em escolas públicas e, talvez, nas católicas.
E, sim, há um tanto de rigidez nessa história toda. Não creio que seja fácil fazer grego e inglês.
Oi Danilo. Muito obrigada por responder. Um bom final de semana para o senhor.
Gerlane, depende da universidade, e você precisa checar em cada uma delas.
Na UNESP de Araraquara era assim (era, porque a grade mudou e eu não sei como está agora): no ato da matrícula você escolhia dois idiomas para estudar durante os dois primeiros anos. Num grupo estavam francês e inglês (quando eu estava quase me formando entrou o espanhol) e, no segundo grupo, italiano, alemão, grego e latim (este último só no período diurno). Então sim, era possível fazer grego e inglês.
Como cada turma tinha um número limitado de vagas, a seleção era feita de acordo com a sua colocação no vestibular. Dificilmente alguém escolhia o grego e o latim, mas lembro que as pessoas que fizeram grego se apaixonaram.
No terceiro ano, tínhamos que optar por uma das línguas, para fazer as literaturas. Era possível também fazer a outra língua no outro período, mas não era fácil conciliar. Outra possibilidade era, depois de terminada a graduação, tentar uma vaga para terminar a outra língua. Nem todos conseguiam.
Mas o que você deve mesmo é se informar na secretaria de graduação da universidade que te interessa. Cada uma é de um jeito e, mesmo que alguém que estudou lá te diga como é, algumas mudanças podem ter acontecido.
Oi Kelli. Muito obrigada pela informação,é de grande ajuda para mim. Continuem a escrever, o blog tem sido de imensa importância e fonte de conhecimento para muitos.
Mais uma vez obrigada!
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