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sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Evento para Intérpretes

Setembro nunca falta alguma coisa interessante para tradutor fazer. Hoje de manhã recebi do CITRAT, da USP uma circular convidando para a X Jornada de Tradução e Terminologia, no dia 30 de setembro de 2009, sobre Interpretação: Formação e Mercado de Trabalho. Vai ser na Casa de Cultura Japonesa - FFLCH, Av. Lineu Prestes 159, na Cidade Universitária, em São Paulo.

Veja o programa:

09h30 - 10h30: Conferencia:

Angela Levy, Associação Alumni

Intervalo - 10h30 - 10h45

10h45-12h15 - Mesa-redonda: Formação de Intérpretes

Prof. Dr. Francis Henrik Aubert - FFLCH/USP Luciana Carvalho - PUC/SP Reynaldo Pagura - PUC/SP

Intervalo de almoço - 12h15 - 14h

14h - 15h - Conferência - Prof. Dr. George Sperber - FFLCH/USP

Intervalo - 15h - 15h15

15h15 - 16h45 - Mesa-redonda: Interpretação: o mercado de trabalho

Ulisses Webby de Carvalho - APIC - a confirmar

Profa. Dra. Roberta Barni - FFLCH/USP

Dr. Dieter Dräter - Instituto Goethe

O público-alvo são os alunos graduados e pós-graduandos em letras, o evento é gratuito e não é necessário fazer inscrição. Serão emitidos certificados aos participantes que comparecerem a todas as palestras. Embora eu não seja nem pretenda ser intérprete, vou lá. Oportunidade para abraçar velhos amigos e muita gente boa vai falar, não dá para perder. Venha você também.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Passa-que-te-passa, de novo

Feita a rasgação de seda entre a Kelli e mim, vamos voltar ao assunto de que estávamos falando. Estava dizendo que é comum o tradutor receber uma solicitação que não pode atender, ou porque não tenha tempo, ou porque não conheça o assunto nem o par de línguas.

É claro que a resposta pode ser simplesmente um "desculpe, não posso fazer". Mas o tradutor médio tem horror a dizer "não" e, neste caso, tem até bons motivos para evitar o terrível advérbio.

Mas indicar alguém, ou aceitar o encargo para repassar a alguém, tem lá seus problemas. Mais de um colega já se queimou por ter feito uma indicação ou repasse envolvendo colegas menos competentes do que pareciam. Um dos perigos reside no processo de "tira uma fatia e passa adiante". Funciona assim: o cliente fala com o Tradutor Alfa, que não pode fazer o serviço, mas aceita e repassa ao Tradutor Beta, tirando um naquinho do preço, só um naquinho. Beta, por sua vez, está ocupadíssimo, mas pega, do mesmo jeito, e repassa a Gama, não se antes dar uma mordidinha no preço. E assim vai.

Não há nada de errado em pegar o serviço a dez e repassar a oito (salvo se mentir e disser "estou te repassando pelo preço que estou recebendo": mentir é sempre errado), mas o fato é que, na segunda repassada, depois de duas mordidas, o preço já está uma miséria. Isso significa que no "segundo subsolo" dificilmente haverá alguém experiente. Nada de errado nisso, tampouco, porque os inexperientes precisam começar em algum lugar. O problema é que uma tradução de gente inexperiente precisa de uma boa revisão e a comissão retida pelos repassantes raramente compensa o trabalhão de rever o texto como merece. Especialmente se houver dois repassantes, cada um deles pegando uma comissão pequena.


Moral da história, serviço mal feito, cliente insatisfeito.


Se você é novato, talvez entre na profissão assim, trabalhando no segundo ou terceiro subsolo e ganhando uma miséria. Bom, por algum lugar tem de começar e ninguém pode esperar ganhar uma fortuna com o primeiro serviço e, aliás, nem com o segundo. O problema está em que seu serviço vai passar por uma péssima revisão e ninguém vai sentar com você para discutirem as falhas.


Obrigado pela visita e volte sempre.

domingo, 23 de agosto de 2009

Faz um ano hoje!

Hoje, 23 de agosto de 2009, faz um ano. Uma coisa divertida, aquilo tudo. Uns dias antes, num encontro de tradutores, saímos a Kelli e eu juntos para o Metrô, que ambos íamos tomar. Um dando trela para o outro e tal e acabamos combinando um almoço em SP, sob o pretexto de eu mostrar alguma coisa da cidade a ela. Uma coisa muito esquisita, de fato. A Kelli jura que não tinha percebido onde eu queria chegar, mas acho estranho que a intuição feminina dela não tenha apontado nada. Porque nada daquilo fazia muito sentido.

O fato é que fazia tempo que eu estava de olho na Kelli para trabalhar comigo. Com sua parca experiência em tradução, parecia ter o potencial para me ajudar a carregar uns tantos fardos pesados demais para meus ombros. Mas só a conhecia da comunidade do Orkut, de cinco minutos em uma palestra e de termos ficado frente a frente em um almoço. Precisava conhecer melhor antes de fazer uma proposta. Por isso, o convite.

No dia combinado, fomos para a Paulista, onde passamos na Martins Fontes e depois fomos almoçar. Depois do almoço, perguntei a queima-roupa: "Você quer um passeio cultural, essa coisa de cinema, museu e livraria, ou uma proposta de trabalho?" Os olhos arregalados, numa aparência de legítima surpresa, ela gaguejou de volta "proposta de trabalho". Então, comecei a desfiar o que tinha em mente, boa parte do que ainda não é de conhecimento geral. Aí é que os olhos dela se arregalaram mesmo. Mas acabou aceitando. Disse acima que acho inacreditável que a intuição feminina dela não tivesse percebido onde eu queria chegar, mas tenho certeza de que intuição nenhuma teria percebido a natureza e amplitude do que eu propus.

De lá para cá, as coisas não deram exatamente como eu previa. Alguns percalços retardaram um pouco o processo. Por outro lado, juntos acabamos descobrindo oportunidades em que antes não havíamos pensado. Quem, como eu, trabalha muito com contabilidade, fala muito em saldo e o saldo desta nossa parceria tem sido muito positivo. Tenho tudo para crer que o segundo ano vai ser ainda melhor que o primeiro.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Passa-que-te-passa

A respeito dessa história de panelinha e igrejinha, deixa contar uma história real para você.

O Banco Alfa, uma entidade supranacional, raramente precisava de tradução para o português, por isso, não tinha um quadro de tradutores brasileiros. Um dia, precisou – e não sabia a quem pedir. Podiam ter posto anúncio em jornal, pedido e analisado CVs, testado e entrevistado clientes, mas o serviço era pouco e não justificava a despesa. Se fosse para contratar um interno, fixo, ainda vá lá. Mas para pouco mais de quinze mil palavras, não valia a pena.
Então, ligaram para o Banco Beta, outro supranacional, onde tinham bons amigos – esse pessoal todo se conhece – e pediram uma indicação. Fui eu o indicado, porque trabalhava para o Banco Beta fazia havia seis ou sete anos e era o que eles conheciam de melhor. Não estou dizendo que seja eu o melhor: estou dizendo que eles não conheciam ninguém melhor que eu, o que é coisa bem diferente.

E lá fui eu, então, trabalhar com o Banco Alfa. Enquanto eu atendia o Banco Alfa, ligou a Empresa Gama, mas eu não podia atender na hora, nem eles podiam esperar, um acontecimento absolutamente normal no nosso ramo. Sendo assim, encaminhei o serviço ao Colega X, que eu conheço e sei que é competente. Já aconteceu o mesmo mais de uma vez. Também já aconteceu de o Colega X me indicar. Um de nós indica o outro porque temos confiança mútua. Não vou indicar um bocó só porque esse bocó me indica. Também não indico mulher bonita na vã esperança de obter, digamos, algum ganho extracurricular na transação.
Mas já aconteceu de eu indicar o Colega X e o cliente dizer que já tinha falado com ele, e que ele estava ocupado. Então, indica-se Y, que não é tão bom, mas quebra o galho. Quando a coisa aperta e Y também está ocupado, procura-se Z, e assim vai.

Já vi momentos em que esgotamos o primeiro time, esgotamos o segundo time e tivemos de pescar no terceiro time, porque uma agência estava com um abacaxi na mão, havia uma porção de gente em um congresso da ATA e, por mal dos pecados, parecia que todos os clientes estavam doidos a procura de tradutores. Numa hora dessas é que o cliente faz uma prece e contrata alguém inexperiente. Se o iniciante der bom desempenho, o cliente volta, todo satisfeito. Se não der, azar de ambos: fez-se o que se pode.

O passa-que-te-passa pode também ser por razões técnicas: a história é mais ou menos a mesma, mas o cliente que procura um tradutor de alemão ou de francês, ou um especialista em medicina, pode perguntar se eu posso indicar alguém e começa tudo de novo. Essas razões técnicas podem e devem ser vistas como razões de qualidade: uma tradução minha sobre medicina feita do inglês não iria ser grande coisa e, portanto, por questões de qualidade, eu recuso e prefiro indicar um colega. Se for do francês ou do alemão, pior ainda.

Sempre digo que qualquer produto ou serviço pode ser definido em termos de três variáveis, preço, qualidade e prazo de entrega. Já analisamos duas dessas variáveis e falta, então, a terceira, o preço. O interessado liga para mim e diz: “Tenho uma tradução de um texto em inglês sobre finanças, tantas palavras, para o dia tal. Interessa?” Sim, claro. Mas precisamos ver o preço. Se não entrarmos num acordo, ele vai ter que procurar mais alguém. Mas, aí, por favor, não conte comigo.

A praxe (ao menos a minha) é: recomendo alguém quando não posso fazer o serviço, ou porque não tenho tempo ou porque está fora da minha competência. Se esse alguém cobra mais ou menos que eu, não me interessa. Mas se o cliente pedir para recomendar um mais barato, eu me recuso a atender. Faz sentido isso para você? O cliente vai ter de achar sozinho. Acha, sempre acha. Mas essa é outra história.

Até amanhã e obrigado.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O Grito de Dor do Principiante

O artigo da Kelli, aí abaixo, é o grito de dor de todos os principiantes. Poucas profissões têm um sistema para incluir o principiante e a nossa não é uma delas. Quem sai da faculdade fica meio sem ter para onde ir e, muitas vezes, vai ensinar inglês, porque não tem a mais remota ideia de como começar a vida de tradutor. Nosso mercado, que eu venho observando e analisando há anos, com as ferramentas que vou adquirindo ao traduzir milhares de textos sobre finanças, economia, marketing e matérias conexas, é muito confuso e pouco transparente.

Não se trata de um mercado fechado, controlado. Nem eu nem ninguém mais tem como fechar a porteira para impedir a entrada dos mais novos. O próprio crescimento do mercado, conjugado com a aposentadoria e morte dos veteranos, abre vagas que vão sendo preenchidas pelos mais novos. Mas é verdade que uma das melhores maneiras de ingressar no mercado é atrair a atenção dos veteranos, porque muitas vezes é o veterano que encaminha aos mais novatos os serviços que não pode fazer.


O caso da Kelli comigo é um pouco diferente, porque não repasso serviço para ela: nós trabalhamos juntos em mil e uma coisas. O fato é, entretanto, que, quando eu precisei de alguém para trabalhar comigo, não anunciei no jornal: convidei uma jovem que me pareceu inteligente, que eu tinha conhecido numa comunidade do Orkut. Se ela não fosse competente, não teria sido convidada (ou teria sido “desconvidada” logo em seguida). Mas também é verdade que se não tivesse participado ativamente da comunidade do Orkut e lá demonstrado sua capacidade, dificilmente teria sido convidada.

Ou seja, como se dizia antigamente, há que crescer (intelectualmente) e aparecer. Mas isso eu já disse mil vezes e o restante do que eu tenho a dizer fica para amanhã. Obrigado pela visita.

Iniciantes que traduzem de tudo

Estou me dedicando ao trabalho com as palavras – traduzindo e revisando – há quase um ano, período em que, por trabalhar com o Danilo, aprendi muito sobre a área dele. Volta e meia me aparecem textos de outras áreas. Eu tenho plena noção de que as minhas traduções e revisões na área financeira não são perfeitas, mas são melhores do que as que faço para outras áreas. Porém, como iniciante, eu não posso me dar ao luxo de dizer não sempre que me aparece algo diferente.

Nessas horas, fico pensando nos veteranos que tanto criticam os iniciantes que “acham que podem traduzir de tudo”. Pois eu digo que existem duas opções: ou iniciantes podem realmente traduzir de tudo, ou então não podem traduzir nada e a profissão está fadada a sobreviver apenas através dos tradutores que já tinham uma profissão / especialização anterior.

Vamos fechar os cursos de Letras-Tradutor. Vamos estabelecer, como pré-requisito para os cursos de tradução todos, que o aluno já deve ter seu nicho preparado. Assim, quem for advogado vai traduzir direito, quem for químico, traduz química, e quem fez Letras, bem... quem fez Letras que vá dar aula, oras.

Tradutor iniciante não pode, realmente, traduzir de tudo. Tradutor iniciante TEM que traduzir de tudo, ou morre de fome. Leva tempo até agências e colegas perceberem que fulano traduz Economia muito bem. Antes disso, fulano vai ter que traduzir muita agronomia, muito contratês, muita coisa que não vai sair tão bem assim, porque não são as coisas para as quais o fulano leva jeito. Com o tempo, ele vai passar a receber textos de Economia com mais freqüência, e vai aprender cada vez mais sobre isso, até se tornar um especialista.

Ninguém vira especialista da noite para o dia. Até mesmo os veteranos cascudos que dizem que “tradutor iniciante pensa que pode traduzir de tudo” já foram iniciantes um dia, e não só na tradução, mas em suas profissões anteriores também. Tenho certeza que foram duas ótimas oportunidades para aprender e para cometer os erros grotescos que hoje eles criticam.

Em tempo: ser iniciante não quer dizer que a pesquisa deve ser mais relaxada e que o empenho deve ser menor, muito pelo contrário. Mas essa, creio, é uma vantagem dos iniciantes: é mais fácil encontrar um iniciante consciente de que tem muito que aprender e que, portanto, seu esforço deve ser enorme, do que encontrar um veterano que saiba que, apesar de trabalhar há tanto tempo com o mesmo assunto, ainda tem coisas a aprender sobre ele.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Mais revisão, ainda!

O artigo da Kelli deu bom Ibope, com uma porção de comentários. Fico satisfeito, porque vocês gostaram e porque assim ela se anima a escrever mais.

O Renato Beninatto deixou um em inglês, que depois tuitou (@renatobeninatto), onde diz que o mais forte não é nem o amor nem o ódio, mas a necessidade de alterar o texto alheio. Certo está ele. É uma compulsão à qual o revisor tem de resistir, a compulsão mesquinha de encher o texto de mudanças, em parte para mostrar serviço ao cliente, em parte para provar a si próprio que é mais competente que o tradutor, que muitas vezes, recebe remuneração maior.

Muda-se quando está errado, muda-se quando a emenda realmente melhora o texto. Não se muda quando "tanto faz, mas eu prefiro assim". Impor as preferências do revisor à tradução é tão antiético quanto impor as preferências pessoais do tradutor ao original.

Explico-me: conheço um tradutor, conhecido por traduzir bem e escrever bem, mas não gosto do trabalho dele: tudo o que ele traduz tem exatamente o mesmo estilo: o dele. Acomoda tudo ao seu leito de Procusto particular. Ler as traduções dele, é como ir a um baile onde se toque de tudo: desde bolerão velho de guerra, até a mais recente ramificação da World Music; desde samba-enredo até hard metal - mas sempre com o mesmo jeitão.

Da mesma forma, há revisores (e editoras) que também impõem um "estilo da casa" ao que passa por suas mãos. É certo que os textos que pasteurizam ficam muito claros e sempre muito corretos, mas não têm gosto de nada.

A Sandra Navarro deixou uma outra impressão interessante, sobre a invisibilidade do revisor, maior ainda que a do tradutor. Quando há revisão (o que nem sempre é verdade, lamentavelmente) os acertos são creditados ao tradutor, os erros são debitados ao revisor. Notei isso quando fiz parte do júri de um prêmio de tradução e um texto foi recusado pelos "erros de revisão" - mas ninguém falou em "boa revisão" nem em criar um "prêmio de revisão".

Uma pena, porque não há boa tradução sem uma excelente revisão.

Acho que ainda vamos voltar ao assunto. A conversa está boa.

Obrigado pela visita e volte sempre.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Mais sobre revisão


O artigo da Kelli ontem chama atenção para o problema da dificuldade de aceitar emendas ao próprio trabalho.

Deixa contar umas coisinhas, assim, meio que em ritmo de fofoca. A Kelli e eu trabalhamos juntos há quase um ano (lembra, Kelli?). Além de cooperar comigo em mil tarefas, como preparação de cursos, ela revisa minhas traduções. Periodicamente, trocamos de lugar e ela traduz para que eu revise.

Quando ela atua como revisora, deita e rola com meu texto, sugerindo mil alterações, na maioria das vezes muito bem embasadas, que eu aceito com prazer. Por outro lado, quando sou eu quem revisa, embora ela não reclame, sente-se que a troca de uma vírgula lhe azeda o dia.

Nisso, a norma é ela, a exceção sou eu. Tradutor tem ódio de ver seu texto modificado. Somos uma raça de prima-donas. Cada emenda, cada sugestão do revisor é vista como uma ofensa, a ser lavada com sangue. Tradutor defende a correção de seu texto com unhas e dentes, a golpes de gramática e dicionário, muitas vezes se esquecendo de que mesmo o que está certo pode ser melhorado e que essa é uma das funções mais importantes do revisor: melhorar o que já está bom.

A Kelli também fala do "estilo danilesco". Isso se aplica mais aos meus originais que às traduções, porque, nas traduções procuro respeitar o estilo do autor — não usando "porca vacca!", por exemplo. Entretanto, não resta dúvida de que o mesmo original, trabalhado por outra mão, resultaria em tradução diferente. Isso obriga o revisor a ser um camaleão, porque, ao remendar um texto meu, não pode aplicar um remendo que destoe do tecido do texto em geral — uma boa revisão é mais um cerzido invisível do que um a aplicação de remendos, por bonitos que sejam.

Aliás, o dicionário me diz que texto tem a mesma etimologia que tecido e já aparecia em Quintiliano, o que não é de surpreender. Esses romanos, certamente, sabiam das coisas.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Sobre revisões

Um dia, o Danilo me pediu para escrever sobre revisão. Ele deve ter achado que eu esqueci, mas naquele momento, eu não tinha muita idéia sobre o que escrever. Aí resolvi, hoje, escrever sobre a minha relação de amor e ódio com a tal da revisão.

Quando comecei a trabalhar com o Danilo, eu não traduzia nada, apenas revisava. Era uma forma de treinar, aprender e ganhar vocabulário, tudo ao mesmo tempo. Hoje, posso dizer que funcionou (bem, ainda funciona): aprendi vários truquezinhos de tradução e já sou capaz de identificar diversos erros de terminologia na área de finanças. Para um período de menos de um ano, acho que foi um grande avanço.

Antes disso, não é segredo, eu era professora. Já nessa época eu tinha muito prazer em corrigir/revisar textos de alunos. A-d-o-r-o ficar caçando errinhos em textos alheios. É como um quebra-cabeça que eu vou ajustando ate que as peças se encaixem melhor. Mas eu não posso mudar o desenho do quebra-cabeça, assim como não posso mudar o estilo do texto que estou revisando. Por isso, acabo assimilando aquele estilo. Já até tenho uma certa facilidade para imitar o estilo danilesco de escrever. É a parte da revisão que me atrai, que eu gosto – quando eu estou no comando, digamos assim.

Mas eu disse que tenho uma relação de amor e ódio, e tenho mesmo. Eu odeio que meus textos sejam revisados. Sim, eu sei que é necessário; sim, eu sei que eu posso aprender muito com a revisão; sim, eu também sei que meus textos melhoram muito depois de passar por uma revisão rigorosa. Mas o fato é que eu me sinto muito exposta quando alguém revisa um texto meu, seja de trabalho ou não. E, quando vejo os zilhões de erros corrigidos, as trocentas alterações marcadas, eu me sinto mal e me cobro muito por isso. Eu confesso que não sei lidar muito bem com meus erros e que leva um tempo para eu me recuperar de uma revisão.

Apesar disso tudo, acredito que minha postura esta começando a mudar, parte por comentários que tenho lido, principalmente no Orkut, sobre revisões competentes, e parte porque resolvi (tentar) não me cobrar mais tanto assim. Da próxima vez que um texto meu for revisado, conto como foi.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

TPICs, qualidade de tradução etc.

O fim do comentário do Marcos Zattar:

Quanto ao segundo fator de qualidade, o terminológico - bem, esses são outros quinhentos. Outros novecentos, eu diria até. Conheço "tradutô jurameintadu" que trabalha a toque de caixa, mal pesquisa os assuntos e a respectiva terminologia, não sabe o que é a função de concordância de uma CAT e vai tocando o barco, cheio de trabalho! Êêêêê beleza... Usar a Web a nosso favor é, sem dúvida, um diferencial de qualidade. Saber encontrar a informação certa num lugar confiável é fruto de paciência, curiosidade e muita, muita vontade de descobrir a "verdade". Alguns não têm essa paciência, outros não querem sacrificar o tempo precioso, que poderia ser usado no shopping gastando os gordos honorários. E outros ainda não compreenderam direito o que é traduzir. Quanto ao fato de Wildcat afirmar que "não tinha conhecimento suficiente do assunto", conto a minha experiência, certamente bastante representativa do mercado tradutório: a não ser que seja uma área especialíssima e cabeludíssima, ou muito exótica, meto as caras. Afinal, traduzir é aprender, e cabeça não foi feita só pra usar chapéu ;-) Claro, ao desbravar novos territórios, o ritmo do trabalho diminui devido às pesquisas e intermináveis leituras. Suponhamos que o assunto do texto do Wildcat não tenha sido tão cabeludo e o problema tenha sido mesmo a baixa qualidade do texto de partida. Aí não tem jeito. Com ambiguidades e passagens em que a compreensão é difícil ou até impossível, só chamando o santo. Ou ficando em comunicação direta e contínua com o autor. Ou explicando a situação pro cliente *antes* de começar o trabalho.

Marcos,

Sempre lembrando que não sou TPIC nem trabalho à sombra de qualquer um deles, tenho di dizer que esse seu fim de comentário, tem, a meu ver, uma falha essencial, a falha da generalização.

Mas tradutores incompetentes e preguiçosos há de sobra em qualquer canto e não me parece que os TPICs sejam muito piores do que os outros. Sem contar que corre por aí que algumas traduções juramentadas nunca passaram pela mão de um TPIC, mas não divulgue isso, por favor, que é mero boato.

Além disso, não acho os emolumentos dos TPICs tão altos assim, não. Além de traduzir, eles têm uma carga infernal de tarefas administrativas e burocráticas que consomem um tempo enorme. Aliás, a minha tabela particular é mais alta que a da junta e não acho meus honorários tão gordos assim. Dá para passear no shopping, sim, mas acho que tenho direito a isso — e a outras coisas também.

Em outros pontos, concordo plenamente. É possível trabalhar em áreas pouco conhecidas, com os recursos de que dispomos hoje, desde que se faça muita pesquisa — o que torna o serviço mais moroso, e, por extensão, menos lucrativo. Eis uma das razões pelas quais fui me especializando. O que eu preciso pesquisar, para fazer um serviço na minha área é muito pouco e, por isso, posso me concentrar em outros detalhes e, evidentemente, ganhar mais.

E quanto ao avisar o cliente de que se conhece pouco a área, acho essencial. O cliente tem direito a informações claras e verdadeiras.

domingo, 2 de agosto de 2009

Início de Carreira

Continuando a resposta à Larissa, vou dizer, mais uma vez, como comecei, agregando os porquês de me ter firmado no mercado. A história, de tão repetida, está batida demais da conta. Mas sempre tem gente que pergunta de novo.

Eu era professor das Escolas Fisk e, um dia, a Arthur Andersen, uma das mais importantes firmas de auditoria da época, perguntou se havia um professor quisesse “fazer umas traduções”. Me ofereceram o serviço. Aceitei, eram quatro horas por dia, seguidas, sem janela, e, ainda por cima, pagas com 50% de acréscimo, por serem “externas”. Qualquer pessoa que tenha trabalhado em cursos de livres de línguas sabe que filé é uma coisa dessas.

Além de tudo, havia muitos anos que eu queria me devotar à tradução, mas, por um motivo ou por outro, a coisa não se materializava. Já estava algo cansado de aulas de inglês e achei traduzir uma delícia. Em pouco tempo, a Arthur Andersen me ofereceu um emprego, como tradutor, e agarrei com as duas mãos.

Logo depois de começar a traduzir lá, procurei a Editora Atlas, que se especializava em contabilidade (de que a auditoria é um ramo especializado) para oferecer meus serviços. Fiz um teste e passei porque criei um caso com o testador, na frente do diretor editorial. O original tinha substitute machines for men, eu traduzir direito e o testador deu bronca, porque lhe escapara a regência peculiar de substitute. O diretor editorial disse “não entendo inglês, mas a única tradução que faz sentido aqui é a que o Danilo deu”. Ainda bem que o testador não era rancoroso.

Me firmei no mercado por três razões:

1. Sempre dei o máximo. Errei, errei muito, fiz muita besteira e ainda erro e faço besteira. Mas nunca deixei de caprichar, de dar o máximo de mim, independentemente das condições.

2. Estudei como um doido. Não sabia nada de finanças nem de contabilidade, vi a oportunidade e li tudo o que fui encontrando, em inglês e português. Hoje, não faço feio entre contadores. Além disso, dei duro no inglês, no português e em técnicas de tradução

3. Participei. Reuniões, congressos, palestras; posteriormente, listas de discussão, artigos para o Translation Journal; cursos… onde houvesse um lugar onde eu pudesse estar, lá estava eu.

Combine esses três fatores e vai dar tudo certo para você. A turma fala que precisa ter sorte. Precisa, sim, mas a sorte bafeja quem está preparado.

Amanhã, falamos de outra coisa.