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segunda-feira, 7 de julho de 2008

Resposts Mal-educadas


Já faz tempo, pelo menos em termos de Internet. No dia 7 de junho de 2004, acordei com espírito de porco e postei o texto abaixo, em inglês, na TCR-D uma lista de discussão internacional. O texto andou por aí, de seca em Meca e, hoje de manhã, uma amiga me avisou que tinha sido repostado em uma lista espanhola. Eu tinha completamente perdido o texto e fiquei satisfeito de recuperar, por cortesia dela. É uma série de respostas mal-educadas que eu usei em um outro momento da minha vida profissional. O LSD$ é uma moeda imaginária, o Lower Slobovian Dinar, ou Dinar da Baixa Eslobóvia, que eu inventei para não ter que dar preços reais. Espero que você goste das historinhas.

–O que você faz?
–Sou tradutor.
–É mesmo? Bacana, mas eu queria saber o que você faz para viver.
–Você quer dizer trabalhar? Eu não trabalho. Ganho tanto dinheiro com as traduções, que não preciso trabalhar.

–Dá para fazer esta tradução em três dias? Estou com uma pressa danada.
–Claro.
–Quando vai custar?
–LSD$ 1500.
–Não é demais para três dias de trabalho?
–Posso fazer em uma semana, se você preferir.

–Dá para fazer um precinho mais camarada para a gente?
–Por quê?

–Você ganha mais que eu!
–É mesmo? Então, porque você não vira tradutor?

–Temos uma cotação mais razoável para este pedido. Tem muito tradutor disposto a pegar o serviço a taxas mais razoáveis.
–Tem sim. Mas também tem muito cliente disposto a pagar a taxa que eu cotei.

–Temos uma cotação uns bons vinte por cento mais baixa que a sua.
–… [Silêncio]
–Oi! –Eu disse que temos uma cotação uns bons vinte por cento mais baixa que a sua.
–Sim, eu ouvi.
–E o que você me diz disso?
–Nada.

[para um cliente estrangeiro]
–Qual é sua menor taxa? –LSD$ X.
–Taxa muito alta para o Brasil.
–Sim, eu sei disso. É bem por isso que eu não trabalho para clientes brasileiros. Eu só vivo no Brasil, mas não trabalho aqui. O melhor dos dois mundos, sabe? Viver no Brasil, trabalhar no exterior.

–Qual é sua menor taxa?
–LSD$ X.
–Santo Deus, como é que você chegou a esse valor astronômico?
–Oferta e demanda.

–Qual é sua menor taxa?
–LSD$ X.
–Tudo isso por uma folha de papel?
–Não, o papel é grátis. É simplesmente a embalagem da tradução. O preço é pelo trabalho de pôr as palavras no papel.

–Os espaços não se traduzem, Por isso, a gente não paga os espaços.
–Muito bom. Vou entregar a tradução sem espaços.

–Conheço uma pessoa que cobra menos que você.
–E eu conheço muita gente que cobra menos que eu.
–Eles são bons tradutores?
–Não faço idéia. Nunca vi o trabalho deles.
–Tá bom, eu conheço um tradutor muito bom que cobra menos que você.
–Então, você tem o problema de decidir quem vai fazer a sua tradução.

–Fulano cobra menos do que isso.
–Você está falando comigo, agora.

–Você ficou maluco!
–Sim, sei disso. Meu psiquiatra cobra uma fábula. Por isso que minhas taxas são tão altas.

–Lamento muito, mas LSD 0,0001 por palavra é o máximo que podemos oferecer. É um projeto muito grande. Estamos fazendo uma proposta para 25 línguas.
–Minha proposta é só para português.

–Lamento muito, mas LSD 0,0001 por palavra é o máximo que podemos oferecer. Vamos ter prejuízo com este projeto.
–Fala comigo quando conseguir um contrato lucrativo.

–Vai ter mais trabalho no futuro.
–Então, vai se acostumando com o preço.

12 comentários:

robertobech disse...

Haha, muito boas, Danilo, adorei!

Anônimo disse...

Adorei o texto!!!

Anônimo disse...

Adorei o texto!!!

Anônimo disse...

Olá! Sou nova por aqui, mas já virei fã do blog (e da comunidade do orkut).

É muito interessante essa história do que é qualificado como trabalho nos dias de hoje.

Quando me perguntam onde trabalho (na verdade, normalmente perguntam "aonde" eu trabalho hehe), sempre respondo: não é onde, é com o quê. E eu sou tradutora.

Se eu digo que trabalho em casa, posso estar fazendo o serviço doméstico, se eu digo que trabalho em copacabana, podem confundir a "natureza" da minha ocupação.

No fim das contas, o que salva a gente mesmo é o bom humor e saber que quando a gente faz o que gosta, tudo fica mais leve.

Parabéns pelo blog!
:)

Laila Paschoal disse...

Hahahaha! Adorei. Não deu vontade de bater num ser desse não?

Anônimo disse...

Danilo, adorei o texto! Existe muita gente por aí que simplesmente não tem noção do trabalho que dá fazer certas traduções. Acham que é "só sentar e escrever", e em meia horinha está tudo pronto. E que os tradutores são uns à-toas na vida.

Thays, minha experiência é mais ou menos como a sua. Muita gente me pergunta "aonde" eu trabalho, eu digo, "sou tradutora, trabalho onde eu quiser". E pior: tem gente que olha para mim com aquele olhar de pena e de revolta e diz: "Mas é um absurdo como são as coisas nesse país! Você fez um curso ótimo numa faculdade boa, fala inglês e alemão e ainda assim está desempregada". DESEMPREGADA, pode? Eu rio para não chorar.

Camilinha disse...

Com certeza, em nossa carreira, se ainda não tivermos oportunidade de escolher pelo menos 5 respostas dadas por você, ainda teremos muita chance eheheheh

Anônimo disse...

Sensacional, como reflete a nossa vida! Por que será que sempre acham que tradução não vale nada? Aliás, Danilo, gostaria de dizer que participei do concurso para tradutor da Jucemg e que a única coisa boa daquela palhaçada foi conhecer o seu Blog. Parabéns!

Ricardo da Mata

Jeferson dos Santos disse...

Eu não sou tradutor... trabalho na área de informática (outra área onde as pessoas tentam pechinchar). Adorei este texto, pois apesar de ter sido colocado em um contexto de tradução de textos, ele pode ser empregado em diversas outras áreas onde tentam desmerecer o esforço e a qualidade de nosso serviço... Adorei...

Emilio Pacheco disse...

Danilo, eu já tinha lido este seu texto em inglês no proz. Está nesta página:

http://tam.proz.com/forum/business_issues/43920-issues_with_word_count_of_documents.html

O melhor de todos foi o texto sem espaços. Esse eu nunca esqueci.

Rafaella disse...

Adorei as tiradas! Eu sou professora de Inglês e o que eu mais ouço é "você só dá aula? que maravilha" e quando digo que trabalho com tradução também quando aparece um projeto, acham que ganho uma fortuna e que é só sentar e psicografar qualquer coisa. Pior do que quem reclama do preço, é quem desce a lenha na qualidade como desculpa para não pagar e a pessoa mal consegue terminar uma frase corretamente... Sem comentários...

Isabella disse...

Danilo,
parabéns! Eu já estava preparada para um bom texto. As suas "historinhas" foram indicadas por uma professora do curso de Formação de Tradutores da PUC Rio. Tomarei a liberdade de anotar as dicas.