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sexta-feira, 17 de abril de 2009

Críticas ao trabalho de tradutores


Um colega deixou um comentário a este artigo e me deu vontade de contar um caso já muitíssimo antigo. Vai tomar acho que dois dias, mas faz parte.

Fui a um congresso de tradutores, antes de 1980, na Alumni, em São Paulo. Na plateia, eu, boquiaberto, perante as grandes vacas sagradas que estavam na mesa diretora. Na primeira fila da plateia, esperando para ser chamado a falar, Paulo Rónai, como sempre tendo ao lado sua esposa. Quer dizer, era pesada, a barra.

Estava falando um crítico literário qualquer, desfiando uma daquelas longas listas de erros de tradução hilários. O homem rebolava alegre em sua vasta erudição, citando erros de tradução de espanhol, francês, inglês, italiano e alemão. Cada grupo da plateia ria dos exemplos em uma língua, claro, que poliglotas de tal quilate não há muitos. Quando o homem resolveu calar a boca, a casa veio abaixo com aplausos.

No lado direito da mesa (tenho a imagem na mente até hoje) ou seja, do lado esquerdo para quem, como eu, estava na plateia, Regina Alfarano, naquela época a alma da Faculdade Ibero-Americana, aplaudiu protocolarmente, de cara amarrada. Quem conhece a Regina Alfarano, sabe que ninguém amarra a cara como ela. Amenizada a tempestade de palmas, começou a Regina a falar. Falou pouco, menos de cinco minutos. Nesses poucos minutos, nos deu uma lição que deveria ter sido gravada, degravada, impressa, publicada e distribuída urbi et orbi e constituir matéria obrigatória em todo curso de tradução.

Lamento não poder reproduzir aqui exatamente o que ela disse. As palavras dela cortavam em cortes profundos e precisos, movidas pela força de sua revolta. Quando – dizia ela – num congresso de advogados, médicos, engenheiros ou o que quer que fosse, veríamos um orador humilhar de tal modo a profissão da plateia e ainda ser aplaudido por todos? Claro que erramos, claro que muitos de nossos erros são hilários, mas em todas as profissões há bons e maus profissionais e mesmo os melhores profissionais erram. Mas nossos intensos aplausos denotavam uma falta de auto estima que somente se igualava à deselegância do orador e de sua fala escarninha. Como poderíamos nós almejar o respeito da sociedade, se nem nós mesmos nos respeitávamos? Não se trata de acobertar os erros dos outros, de corporativismo. Trata-se do uso que se faz desses erros.

O constrangimento era grande, mas os aplausos foram maiores ainda. Tomamos todos um grande sabão da Regina – eu, incluso, porque era um dos que mais riu entre os que mais riram – pelo qual até hoje estou grato.

Fiz inúmeras palestras, desde então, mas sempre me recusei a fazer essas listas de erros cômicos. Acho mais importante e digno compartilhar o conhecimento que ridicularizar o erro.

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