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segunda-feira, 30 de julho de 2007

O tradutor e seu status

Podem os tradutores exigir os mesmos direitos autorais do autor sobre a obra traduzida?

Essa é a pergunta que me manda uma estudante. Não sei se consigo responder, mas vou tentar.

O estatuto jurídico do tradutor é governado pela lei nº 5.988, que você encontra aqui http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L5988.htm, da qual colho alguns excertos:

1. As adaptações, traduções e outras transformações de obras originárias, desde que, previamente autorizadas e não lhes causando dano, se apresentarem como criação intelectual nova.

2. Depende de autorização do autor de obra literária, artística ou científica, qualquer forma de sua utilização, assim como: [...] a tradução para qualquer idioma.

3. É titular de direitos de autor, quem adapta, traduz, arranja ou orquestra obra caída no domínio público; todavia não pode, quem assim age, opor-se a outra adaptação, arranjo, orquestração ou tradução, salvo se for cópia da sua.

Os três parágrafos acima não são meus, são da lei. Deles se depreende que:

(1) o tradução é obra intelectual nova, da qual o tradutor é autor. Quer dizer, a autora dos livros da série Harry Potter é J.K. Rowling, a autora da tradução da série para o português, que você encontra em todas as livrarias, é Lia Wyler.

(2) Como J.K. Rowling é a autora da série, a obra é dela, e Lia Wyler somente pôde traduzir porque foi autorizada pela autora. Na prática, a editora brasileira negociou os direitos de tradução, e, tendo obtido esses direitos, contratou a Lia para fazer a tradução. O contrato, que eu não vi, certamente faz menção a exclusividade. Nenhum editor vai adquirir direitos autorais sem a certeza de que não vão ser vendidos, igualmente, a um concorrente: qualquer edição que você encontrar por aí e não for da Rocco, é ilegal.

(3) Se, em vez de traduzir uma obra que ainda tem sua propriedade intelectual protegida, como é o caso da série Harry Potter, a decisão fosse traduzir algo que já tivesse caído no domínio público, não seria necessária autorização de ninguém. Por outro lado, se alguém cismar de retraduzir Shakespeare, que está no domínio público, e descobrir que tem alguém mais traduzindo exatamente a mesma obra, não tem do que reclamar.

A lei não diz que a Lia deva ganhar tanto quanto a Rowling, não que a Lia fosse reclamar, claro. Nem diz quanto a Lia deve ganhar. Nem diz que deve ganhar alguma coisa. Diz que ela é autora da tradução. Isso significa que quem quiser publicar a tradução da Lia tem que se entender coma Rowling, que é dona da obra original e com a Lia, que é dona da tradução.

Teoricamente, a Lia poderia ter traduzido e procurando quem lhe pagasse melhor. Na prática, foi o editor que a encarregou de traduzir e contratou com ela uma remuneração. Volto ao aspecto remuneração amanhã – se conseguir voltar a escrever todos os dias. Entretanto não quero encerrar sem mencionar outro ponto: A Lia ganhou grande notoriedade com o HP. Se tivesse traduzido alguma obra desconhecida escrita por algum autor obscuro e que fosse se juntar à longa lista dos encalhes editoriais, dificilmente estaria sorrindo para nós no jornal de domingo. Por outro lado, se tivesse feito uma tradução de má qualidade, não adiantaria o sorriso, porque ia tomar paulada de tudo quanto é lado.

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