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quarta-feira, 30 de abril de 2008

O Cenossão

Era uma vez uma empresa que achava que pagar tradutor para o inglês ainda vá lá – mas que traduzir do inglês qualquer funcionário podia e devia. Um dia, receberam a visita de um inspetor de segurança, vindo da matriz, que ficou horrorizado de ver, na fábrica, o pessoal fumando em baixo das placas de é proibido fumar e, por isso, incluiu no seu relatório um item enforce the smoking prohibition, querendo dizer, obviamente, que quando alguém se pusesse a fumar nas áreas onde era proibido fumar, deveria ser abordado por um dos seguranças e ser obrigado a apagar o cigarro.

Mas a regra da empresa era não pagar profissionais para traduzir do inglês, como eu disse, então, pegaram algum funcionário mais jovem, distraído e indefeso e disseram: aproveita o fim de semana para traduzir este relatório. O infeliz levou o papel para casa e traduziu, a duras penas e de muito má vontade. Entregou na segunda-feira de manhã e foi cuidar dos seus afazeres. Esse funcionário nem era, nem queria ser, tradutor. Sua profissão era talvez advogado ou engenheiro e, para ele (ou ela), tradução não era coisa nem séria nem importante. Então, esqueceu do incidente e foi se preocupar com coisas sérias.

A tradução era neessária porque o encarregado de segurança na fábrica era um funcionário mais antigo, do tempo em que a empresa ainda não fazia questão de que todos os funcionários "soubessem" inglês. Então, o encarregado da segurança pegou a tradução e começou a responder os quesitos. Primeiro: reforçar a proibição de fumar. Não sabendo inglês, não lhe poderia ter ocorrido que o reforçar era uma falsa tradução para enforce e aceitou a recomendação ao pé da letra – embora se sentisse algo ofendido: a fábrica tinha já uma quantidade enorme de placas de é proibido fumar. Por isso, sua resposta começou assim: embora a fábrica já conte com mais de 50 placas "e proibido fumar" grandes e visíveis, vamos mandar afixar mais outras tantas.

Pronta a resposta, e aprovada por quem de direito, me pediram para traduzir para o inglês. Foi só abrir o papel e senti, na hora, como você também teria sentido, o cheiro de enxofre. Alertei a secretária, que me olhou bem no fundo de meus olhos vesgos e disse Danilo, traduz o que te mandam. Traduzi, foi para os EUA, cobrei, recebi.

Não sei que fim teve a história. Aquela era uma empresa de rápidas mudanças de pessoal e rumo e nem sei se alguém leu a resposta que eu traduzi. Mas, se leu, deve ter achado o pessoal de São Paulo um bando de cenossões*.

*Uma explicação sobre cenossão. Há tempos circula a história de um aluno que escreveu cerumano em vez de ser humano. Pode ser mentira, mas é ótima. Baseado nessa história, lá na comunidade dos tradutores do Orkut, criei o termo cenossão, que é o sujeito tão sem noção que não sabe escrever sem noção. A mensagem original está aqui .

Obrigado pela visita e volte amanhã, a ver se tenho algo de bom para dizer.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Existe tabela de preços para tradução?

Hoje vou trabalhar para o inimigo. Escreveu ontem a Ana Paula, que é cliente (não minha), quer dizer, compradora de traduções, e pergunta como é que funciona essa coisa de preço, porque um tradutor falou a ela em tabela obrigatória, o que foi uma surpresa, porque outro tradutor não falou em tabela alguma e cada um cobra um preço e tal. A mensagem dela é longa e não vou colar aqui. Só vou dar uma resposta.

Existe uma tabela obrigatória em cada Estado, estabelecida pela Junta Comercial do respectivo Estado e aplicável exclusivamente às traduções juramentadas. Tradução juramentada só quem pode fazer é TPIC. Se não sabe o que é TPIC, clique aqui. Fora disso, os preços são livres.

O TPIC também pode fazer traduções não juramentadas, que eles chamam traduções livres, um nome que não me agrada, mas isso é outra história. As "traduções livres" feitas pelos TPICS não estão sujeitas a tabela alguma, mas eles tendem a cobrar todas as traduções pelo mesmo preço, o que é direito deles. As tabelas das diversas juntas estaduais diferem e são atualizadas muito irregularmente, segundo princípios e critérios que provavelmente ninguém entende.

Existe uma tabela do SINTRA, o Sindicato Nacional dos Tradutores, que é algo confusa e serve como referencial para muitos profissionais, mas não é obrigatória: segue quem quer – e quem pode.

Os preços, na realidade, variam enormemente. O mínimo dos absolutamente mínimos, que eu saiba, é de R$ 0,03 por palavra do original para tradução de língua estrangeira ao português e R$ 0,06 para tradução do português a uma língua estrangeira, preço de fome pago pelas agências mais muquiranas e miseráveis. Haverá, quem sabe, quem menos ainda pague. Viver com esse pagamento não chega a ser fácil, digamos assim.

Os profissionais mais tarimbados cobram muito mais. Meu piso, atualmente, é R$ 0,25 por palavra do original, para traduções do inglês para o português, por exemplo. Coincidentemente, o mesmo que consta na tabela do Sindicato. Entretanto, já cobrei mais ou menos que a tabela do Sindicato. Deve haver quem cobre mais.

Vale a pena pagar R$ 0,25 por palavra ou até mais, quando se encontra gente disposta a cobrar um oitavo desse valor? Boa pergunta! Meus clientes acham que sim, mas tem quem ache revoltante pagar tudo isso por uma simples tradução, quando tem muita gente com preços mais em conta. Na verdade, se a tradução de três centavos satisfaz, pagar mais que isso é desperdício. Agora, precisa ver se o cliente entende do riscado o suficiente para poder avaliar a qualidade de uma tradução. Deixa terminar com uma historinha interessante.

Um escritório de advocacia aqui de São Paulo, membro de uma rede internacional, recebeu uma carta-consulta de um cliente estrangeiro. Ficaram todos satisfeitos, claro. Prepararam uma resposta a capricho, toda enfeitada como é hábito dos advogados, e mandaram traduzir. Leram a tradução recebida palavra por palavra. Acharam uma maravilha. Não que estivesse boa, mas é que, para os olhos tupiniquins dos advogados do escritório, de português baço e inglês ralo, o Tupiniquinglish da tradução parecia de uma transparência e precisão totais: uma verdadeira perfeição tradutória. Para eles, evidentemente, quanto mais Tupiniquinglish, mas bonito ficava. Mandaram para o cliente, com casca e tudo. Mas o fato é que o cliente era inglês e ninguém lá entendia Tupiniquinglish muito bem. Dois dias depois, receberam um e-mail que dizia, simplesmente: Please, find another translator. Thank you.

Ainda bem que o advogado que recebeu o e-mail sabia algum inglês e não precisou mandar traduzir o e-mail: ia ser a maior saia justa para o coitado que tinha traduzido o engrimanço para o inglês.

Amanhã, conto uma outra historinha divertida, mas de tradução do inglês para o português. Este artigo já está longo demais.

Obrigado pela visita.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Fiz um teste numa agência!

O colega novato está todo pimpão porque fez teste em uma agência. Mandou o teste, está ansioso pela resposta. Mas a resposta não vem. Podiam – diz numa mensagem a um grupo de tradutores – ao menos dizer se foi aprovado. Esperava, é verdade, um retorno mais pormenorizado, o teste corrigido, avaliado, comentado. A decepção é grande.

Mas, querendo o não, é assim que funciona.

As agências recebem toneladas de currículos e de testes todos os dias e como todos os dias nas agências são uma verdadeira loucura, a análise sempre fica para amanhã. E cumpridores de seus compromissos, o amanhã vemos isso é mantido todos os dias.

Currículos e testes são guardados em pastas para leitura futura, às vezes com alguma marca para identificar o par de línguas e especialização. Alguns são destruídos na hora, quando quem recebe acha que o candidato não tem condições de trabalho. Por exemplo, um CV onde consta estudo inglês à dez anos provavelmente vai para o cesto de lixo na hora. A maioria dos testes e CVs, entretanto, é preservada.

As agências vivem sob pressão imensa, tanto de prazos como de custos e, de modo geral, preferem entregar os serviços a gente em quem já tem confiança. Quer dizer, o setor de vendas aceitou um pedido de 120 laudas para fazer em três dias. Não tem quem dê conta sozinho, tem que dividir entre três tradutores e rezar para nenhum atrasar. Quem vai se arriscar com um desconhecido, numa hora dessas, especialmente se for inexperiente?

Bom, e quando é que chega a hora do novato, do iniciante? Geralmente, na hora do sufoco. Não tem ninguém conhecido para dar jeito em um serviço; então, vamos abrir a pasta de CVs e testes. Fuça-que-te-fuça, achamos alguém que parece ter alguma chance. Liga para ele já, pelo amor de Deus! Telefone não atende. Pega outro, vamos, rápido, que o tempo se escoa. Tem mais este, vamos ver, trim, trim, trim, alô, é da casa do fulano? Olha, nós temos um serviço para você. Está ocupado? Obrigado, fica para a próxima. Outro, vamos lá. Até que aparece um que pega o serviço. O gerente de projeto suspira, faz uma prece e carrega na Maracujina.

Lembre, agora, por favor, que eu não tenho uma agência e nem repasso serviço a ninguém, mas sei como as coisas acontecem. Não estou dizendo que este seja o melhor dos mundos, estou afirmando que este é o mundo em que vivemos. Também é bom lembrar que a vida nas editoras é menos histérica, porque os prazos, embora apertados, não se contam em horas e nem é comum dividir serviço entre meia dúzia de tradutores.

Para você, que está começando, isso significa que a agência à qual você mandou o teste ou o CV pode demorar meses para te chamar, ou pode não chamar nunca. Por isso, fazer três ou quatro contatos não é nada. Pense em termos de ao menos uma dúzia. E não espere milagres instantâneos. Pode demorar um bom tempo até formar a carteira. Mas o primeiro cliente é sempre o mais difícil de conseguir.

domingo, 27 de abril de 2008

Diz-me com quem andas…

O que significa sela? Bom, depende. Se for a sela do cavalo foi feita por um velho seleiro de Goiás, é uma coisa; se for em ela jamais sela as cartas que manda, já é outra. Quer dizer, o sentido de uma palavra depende do contexto. O contexto são as palavras que vêm antes e depois.

Há um outro dado que às vezes escapa: a tradução começa depois de a gente entender o texto de partida e, mesmo quando se entende, nem sempre a tradução é óbvia. Um dos motivos é que muitas vezes o que é verbo numa língua vira substantivo em outra ou até advérbio em uma terceira, processo que se chama transposição. Quer dizer, a tradução melhor de um determinado termo só pode ser determinada levando em conta os termos mais próximos. Por exemplo, drive, entre outras mil coisas, significa dirigir um veículo, um carro, por exemplo. Mas essa informação não resolve muito o problema de quem está procurando um boa tradução para He drove uphill… Ele dirigiu seu carro colina acima, evidentemente, não é uma boa solução.

Daí que fico sempre surpreso quando, em fóruns de tradutores, alguém pede a tradução de uma palavra, assim, sozinha, sem contexto nem nada. Mais surpreso ainda quando o consulente diz o contexto é um contrato. Contrato, que eu saiba, pode ser gênero textual, mas contexto não é. E muito mais ainda quando o consulente apresenta como contexto um pedacinho da sua tradução e a palavra ignorada no original. Contexto, vamos lá de novo, é sempre um pedacinho do original ou do texto de partida, como é moda dizer hoje. Minha admiração culmina com os que agregam definições mil, mas não contexto.

Parece até que a turma paga o contexto do bolso deles.

Procuro atualizar este blog diariamente com alguma coisa interessante sobre a profissão de traduzir. Se gostou, volte sempre. Se não gostou, deixe um comentário reclamando ou dando sugestões.

sábado, 26 de abril de 2008

Riscos financeiros da tradução

Quando aparece um serviço, você pode aceitar ou recusar.

Se recusar, corre pelo menos dois riscos: o de ficar de mãos abanando um bom tempo e o de perder o cliente. Se aceitar, corre pelo menos outros dois: o de ter de rejeitar uma oferta melhor, porque já tem todo seu tempo ocupado, e o de não ser pago no prazo, ou mesmo de não ser pago. É desse risco que vou falar hoje.

Serviço prestado no prazo combinado tem de ser pago no prazo combinado e pronto. Isso eu já disse até cansar aqui e alhures. Se você quer se meter a empresário da tradução, pegando serviços e repassando a terceiro, primeiro muna-se do capital necessário para encarar o problema se o cliente final não pagar. Se não tiver o capital, não se meta. Quer dizer, imagine o seguinte: e se o cliente final não pagar, o que é que você faz? Até que nível você pode garantir a parada e pagar o tradutor no prazo? Se for uma tradução de R$ 500,00, você agüenta o tranco? E se for de R$ 5.000,00?

Mas a turma não cria juízo, banca jogadas que não pode bancar. Fica como nos desenhos animados, que aparecem os cifrõezinhos piscando nos olhos, quando vê serviço grande pela frente. Depois, chora.

Do ponto de vista do tradutor final, quer dizer, de quem realmente meteu a mão no teclado, as considerações são um pouco diferentes, mas, por assim dizer, simétricas. Quer dizer, se Alfa te oferece um serviço, você tem que se perguntar se Alfa tem condições de bancar o jogo e mesmo se o cliente final é confiável.

Por exemplo, todos nós sabemos que governo paga quando quer. Se Alfa te oferece uma fatia de um serviço para o governo, você pode ter certeza de que o cliente final vai atrasar e receber vai ser uma odisséia. Se Alfa não tiver cacife para topar a parada em caso de atraso do cliente final, nem pensar, salvo se você estiver com disposição para esperar até que se disponha a pagar Alfa, sem tugir nem mugir.

Se Alfa tiver dinheiro e estiver meramente te sacaneando, botar a boca no trombone pode ajudar muito. Mas se a burra estiver vazia, nem que você toque O Vôo do Besouro no trombone vai ajudar.

Aliás, para aliviar um pouco este artigo azedo, quem sabe você quer ver este arranjo de Vôo do Besouro para piano e trombone. Obrigado pela visita e volte sempre.




quinta-feira, 24 de abril de 2008

Uma traduçãozinha, pelo amor de Deus!

Nos diversos grupos de tradutores de que participo, é rara a semana em que não aparece alguém dizendo coisas do tipo Alguém pode me indicar nomes de empresas para me cadastrar e conseguir traduções, que estou precisando muito. Se souberem de alguma coisa me avisem. Há mil variantes, mas o fulcro é o precisar muito. Às vezes, vêm uma ladainha apensa, do tipo fui abandonada pelo meu marido e tenho dois filhos para sustentar, ou está faltando dindin para pagar a facu.

Comovente, sem dúvida, principalmente para mim, porque me lembra das minhas próprias agruras financeiras, embora nunca tenha sido abandonado pelo meu marido nem tenha feito faculdade. Comovente, sim, mas a abordagem errada.

O sucesso profissional depende, em grande parte, da adoção de uma postura profissional e a postura de quem escreve desse jeito não é a de profissional, mas sim a de mendigo. E quem se apresenta como mendigo dificilmente vai ser tratado como profissional.

Tradução é serviço profissional, que se confia a quem tem condições de prestar. E quem posta pedidos de esmola, que apela à piedade e caridade alheias, está começando por omitir a primeira e mais importante informação sobre o profissional: suas qualificações.

Se um de meus clientes me pedir um serviço que eu não possa prestar, vou indicar a ele um colega que me pareça capaz de prestar o serviço, não quem estiver de mão estendida à minha porta. E que sei eu a respeito do ou dá colega lá em cima salvo que está precisando de dinheiro? Nem com que línguas lida a pessoa diz! Não sei se tem experiência, se não tem, se conhece memórias de tradução, que idade tem, o que já fez na vida, não sei nada. Só sei que está precisando.

Além de tudo, a pessoa se coloca em uma posição passiva: alguém, por favor, mande a ela uma lista de empresas. Alguns têm o desplante de pedir que se lhes mande a lista de clientes para seu e-mail particular, em vez de divulgar para o grupo como um todo. Se tivesse lido as mensagens do grupo durante três ou quatro dias, teria visto que não é assim que as coisas se fazem, teria aprendido alguma coisa. Mas está precisando, então, posta um pedido e, por favor, alguém que lhe resolva a situação. Como se nós outros tivéssemos excesso de clientes e pudéssemos dispor de meia dúzia em favor de pessoa que nem sequer conhecemos.

Finalmente, se alguém pensa que é só se cadastrar em algum lugar e esperar que o serviço venha chegando, desista. Não é assim que as coisas acontecem.

Aqui neste blog e onde quer que esteja, sempre lutei pela profissionalização do tradutor. Tradução não é esporte, brinquedo, diversão, quebra-galho, ajeito na hora do sufoco. É, cada vez mais, uma profissão. E profissão que faz são os profissionais, não uma lei qualquer.

É por causa de escritos como este acima que criei fama de rabugento, implicante, antipático e desumano. Desculpe, mas alguém tem de ter a coragem de dizer certas verdades.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Especialização

Um dos modos de ganhar mais é especializar-se. O especialista ganha mais por dois motivos: primeiro porque tem de fazer menos pesquisa; segundo, por ser mais bem remunerado, puxando os preços para cima. Das "puxadas", falei já aqui. Faz menos pesquisa porque os termos e conceitos se repetem; é mais bem remunerado porque se espera que seu produto seja de melhor qualidade, o que pode ser verdade ou não.

Há dois tipos de especialista: os natos e os feitos. Os especialistas natos são os que têm uma formação profissional anterior à sua dedicação ao traduzir. Por exemplo, o médico que, depois de aposentado, vira tradutor é um especialista nato em tradução médica. Os especialistas feitos são gente como eu, que acabei virando especialista em finanças mas, quando comecei na profissão, não era capaz de ler um balanço.

O especialista feito é feito pelo mercado. Quer dizer, eu jamais disse vou me especializar em finanças. O que me especializou foram aquelas duas senhoras que mandam na nossa vida, Dona Virtù e Dona Fortuna, das quais aqui falei muitas vezes. Virtù é o que temos em nós próprios, nosso potencial, jeito, talento, dom, esforço, chame como quiser. Fortuna são os fatores externos, as coincidências da vida.

Dona Fortuna me jogou no colo umas coisas de contabilidade e Dona Virtù me ajudou a fazer um serviço decente. Daí veio a reputação de que eu era capaz de dar jeito nessas coisas de contabilidade e, em seguida, vieram outros assuntos correlatos.

O especialista, por outro lado, é um prisioneiro de sua especialização: raramente alguém me oferece alguma coisa fora da minha área de especialização e, quando oferecem, eu recuso. Estou muito bem, aqui no meu canto.

Obrigado pela visita e volte sempre. Abandonei uma porção de coisas que fazia para cuidar melhor deste blog e espero voltar a postar todos os dias. Por falar nisso, você já notou que lá em cima, do seu lado direito, há uma caixinha com o nome pesquisar blog? Serve, evidentemente, para pesquisar nos arquivos anteriores deste blog que já está ficando bem grandinho. É bem possível que a resposta que você procura esteja lá. Se não estiver, pode me escrever fazendo a pergunta que, se eu tiver uma resposta, dou com prazer, aqui no blog, mascarando a sua identidade, para não dar bandeira demais. Se não tiver, paciência.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Caixa Postal

M. preparou um pequeno glossário de uma língua falada em certo país e algumas áreas circunvizinhas e me pergunta se precisa de ordem do governo do país para publicar seu trabalho.
Não, não precisa. Mas é bom citar as fontes de onde retirou o material.

K, por outro lado, quer saber quando vai haver concurso para Tradutor Juramentado e Intérprete Comercial no Rio Grande do Sul. Não sei. Você tem que perguntar à Junta Comercial do Estado do Rio Grande do Sul. Esses concursos são raros, muito raros. Em SP, onde são mais freqüentes, o intervalo médio está em torno de 25 anos. Está rebentando aí um em Minas Gerais, isso sim.

Se você pretende prestar concurso para TPIC, lembre-se que o exercício da profissão é limitado aos cidadãos brasileiros, naturalizados ou natos.

Um desabafinho

Este não é, a bem dizer, um blog pessoal, mas sim profissional e aqui falo de tradução, não de minha vida. As historinhas pessoais que conto são todas relacionadas com a profissão e sempre citadas como exemplo para discussões de cunho profissional. Hoje, temos uma exceção.

Atravessei longa seqüência de problemas de todos os tipos e tamanhos que, espero, tenha culminado num 21 de abril especialmente aziago, com vários problemas e notícias infaustas.

Digo "culminado" porque espero que amaine um pouco de hoje em diante. Essa tempestade de acontecimentos desagradáveis me levou a várias mudanças de rumo, em busca de portos mais seguros e amigáveis.

Algumas dessas mudanças concernem exclusivamente a mim e minha família, e não vão ser analisadas nem sequer divulgadas aqui. Duas, entretanto, talvez sejam interessantes para os que costumam vir aqui ler as coisas que escrevo. A primeira é que, de hoje em diante, vou devotar mais tempo a este blog, que, coitado, anda meio abandonado. A segunda é que jamais vou prestar declarações à imprensa de novo. Quando quiser fazer qualquer tipo declaração, faço aqui e acabou-se a história;

Agora, preciso terminar uma revisãozinha que vai para a Europa e, por isso, precisa ser terminada mais cedo – o problema dos fusos horários. Mais tarde volto com alguma coisa que, espero, seja útil para todos nós enquanto tradutores. Espero que você goste.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Tradutor Público – O Concurso em Minas Gerais

Escreveu o Fernando, levantando umas questões interessantes:
"Pretendo prestar o concurso agora para TPIC de Minas Gerais, mais tenho medo de não estar apto para o cargo, devido aos aspectos legais das traduções. Primeiramente pensei em prestar de qualquer maneira, mesmo até para ‘rechear’ meu currículo ainda jovem de tradutor, quando me deparo com isto:

"1.5 A nenhum tradutor público e intérprete comercial é permitido abandonar o exercício do seu ofício, nem mesmo deixá-lo temporariamente, sem prévia licença da JUCEMG, sob pena de multa e, na reincidência, de perda do ofício.

"Pesquisando um pouco mais, cheguei à informação de que existe um compromisso que envolve 2 laudas por dia. O que pude entender é que o TPIC não pode recusar esse trabalho, gostaria de saber mais sobre como funciona isso na prática.

"Você postou no orkut que não existe trabalho para tantas vagas, é obrigação do tradutor aceitar todo trabalho que lhe é pedido?

"O tradutor habilitado em todo o território do Estado de Minas Gerais que mora em uma cidade do interior, pode pegar serviços via internet, por exemplo, de Belo Horizonte? Ou recusar serviços de outras cidades mais longe? A internet é um meio usado ou somente traduções entregues pessoalmente?

"Me desculpe estar tomando seu tempo e da minha falta de profissionalismo. Se puder me ajudar agradeço."

Fernando, pedir informações não é falta de profissionalismo. Vamos ver o que consigo te responder.

Não sei qual vai ser o teor do concurso. Não tenha como certo que enfatize muito o aspecto jurídico. Preste. Na pior das hipóteses, você dá uma volta em Belo Horizonte.

Depois de nomeado, de fato, você precisa de licença da Junta para deixar o seu ofício, mesmo que temporariamente. Isso não quer dizer que você precise ficar disponível para os clientes dia e noite. Significa que se você for, por exemplo, ficar três meses no exterior, precisa requerer licença à Junta e a Junta normalmente concede sem problemas. E se você for aprovado e não quiser tomar posse, direito seu. E se tomar posse e no dia seguinte pedir afastamento, também direito seu.

Não conheço qualquer compromisso de duas laudas por dia. Não creio que exista. Tradicionalmente, não se cobra taxa de urgência quando o prazo exigir menos de duas laudas por dia útil, norma que pode estar incluída no regulamento da JUCEMG ou não. Mas nada te obriga a fazer duas laudas por dia.

Na prática, o cliente aparece com um trabalho, o TPIC cota preço (de acordo com a tabela da Junta Comercial de seu estado) e prazo. Se o cliente quiser urgência e o tradutor tiver disponibilidade, pode-se aplicar a taxa de urgência prevista pela Junta. Cobrar a taxa é direito do tradutor, mas o cliente não pode impor prazo dizendo estou pagando a taxa de urgência. Se você não puder fazer no prazo pretendido, recusa o trabalho e pronto. Evidentemente, é seu interesse aceitar e procurar atender, mas não sua obrigação. E se aceitar, tem de cumprir.

O TPIC recebe papel e entrega papel. Quer dizer, se eu quiser uma tradução de uma certidão de nascimento, tenho de levar a certidão ao escritório do TPIC, que faz a tradução, assina, numera e carimba o verso da certidão original e apõe o número da tradução no carimbo. O cliente apresenta original e a tradução juntas à autoridade competente e cabe a quem recebe comparar o número do carimbo com o número da tradução, para ver se não estão fazendo safadeza com ele. Sendo assim – e sendo os preços tabelados e iguais em todo o estado – me parece pouco provável que alguém em BH vá procurar um TPIC em Santo Antonio do Amparo. Por outro lado, quem morar em Perdões ou Santo Antonio do Amparo, talvez prefira os serviços de um TPIC em Campo Belo, mesmo que mande e receba documentos pelo correio.

Você não disse onde mora e, a bem dizer, conheço mal as Gerais, mas pode haver um bom mercado regional para esses serviços em certas áreas do estado. A capital tem maior clientela, mas também tem mais concorrência. E, de qualquer maneira, todo TPIC também faz traduções não juramentadas, o que eles chamam "livres" , e que podem vir via Internet. Quer dizer, nada impede que você more em Santana do Jacaré e seja um tradutor bem sucedido, com clientes em tudo quanto é canto deste mundo. Mas um TPIC que more em Santana do Jacaré , dificilmente vai ter muitas traduções juramentadas.

Para mais informações sobre o concurso, clique aqui e aqui e e para mais informações sobre o ofício de Tradutor Público e Intérprete Comercial, clique aqui.

domingo, 13 de abril de 2008

Vamos continuar a falar de preços? Mais sobre a "puxadinha"

Esta conversa mole toda sobre preços vem daqui onde falo de preços médios e do que chamo a "puxadinha", ação de "puxar" o preço um pouco mais para cima ou para baixo da média do segmento. O Sidney Barros, Jr. deixou um comentário, dizendo a puxadinha em geral era para baixo. Discordo. Se a puxadinha for em geral para baixo, a média em si cai.

Puxa-se para baixo para entrar num mercado e o próprio ato de puxar para baixo clama aos quatro ventos que se tem pouca experiência, que se está sem serviço.

Pior ainda quando o tradutor é veterano. Se você está entrando agora no mercado e aceita um pouco menos que a média, pode estar procurando achar o seu lugar ao sol, oferecendo um incentivo extra ao cliente – seja agência ou não. Entretanto, um sujeito que tem dez anos de carreira na cacunda e aceita trabalhar por menos que a média ou permanece nos mercados "de carregação", precisa dar uma olhadinha mais atenta no seu trabalho como tradutor ou como vendedor do próprio peixe.

À medida que você vai firmando o pé em um determinado segmento do mercado, abandona a puxadinha para baixo. E quando está com o pé realmente firme, com um bom fluxo de serviço, está na hora de puxar para cima, de migrar para um segmento mais bem remunerado ou fazer ambas as coisas ao mesmo tempo.

Aumentar os próprios preços é um ato de coragem. A maioria dos tradutores tem uma visão excessivamente pessimista do mercado e acredita que todo cliente sempre procura o tradutor mais barato e que, portanto, a única maneira de conseguir o serviço é botando o preço lá em baixo. Não é verdade, e espero demonstrar isso amanhã. Por hoje, é só.

sábado, 12 de abril de 2008

Cooperativas de tradutores

Interrompo um momento a série sobre preços e calotes para falar sobre cooperativas. A cooperativa é vista por muitos como a salvação da lavoura. A turma vê as agências como um bando de ladrões e exploradores do tradutor e acha que, com uma cooperativa, as coisas iam dar mais certo.

Muitas agências são, de fato, desonestas e muitas mais são simplesmente mal administradas, sem contar que há ainda uma grande quantidade que não tem capital suficiente para financiar suas operações, um problema mais freqüente e mais grave do que se pensa. Mas aqui estamos para falar de cooperativas, não de agências.

Antes de mais nada, se você ainda simplesmente se diz "freelance" ou o que é pior "frila", acho que é bom ler isto e isto para deixar de se enquadrar em uma categoria que não existe.

Indo ao assunto, se você entrar para uma cooperativa, tem que entrar ou como autônomo ("RPA" ou "Nota da Prefeitura") ou como estabelecido (empresário individual ou membro de uma sociedade – Nota Fiscal de Pessoa Jurídica com CNPJ). Entrar de gaiato, não pode. Se você entrar como autônomo, a carga tributária sobre os seus serviços aumenta em cerca de 20% e esse aumento vai ter um efeito ou no preço final cobrado do cliente ou na sua retirada.

No capítulo atendimento, a cooperativa funciona da mesma forma que uma agência: tem que selecionar tradutores e revisores, achar clientes, fazer propostas, cotar preços, distribuir o trabalho, coordenar produção, revisão e entrega, cobrar e receber do cliente, manter registros, pagar tradutores e o que mais seja.

Na agência, esses serviços são financiados com a margem, quer dizer, com a diferença entre o que a agência cobra do cliente e o que ela paga ao tradutor. Numa cooperativa, o procedimento é o mesmo, mas os cooperados podem se juntar para dar conta dessas tarefas, em vez de contratar quem faça. Por exemplo, um trata de vendas, outro seleciona tradutores, mais um cuida da papelada, outro ainda distribui serviço e assim vai. Isso toma um tempo danado e, lá pelas tantas, esse pessoal vai ter que ser remunerado, porque vão ter muito menos tempo para traduzir que seus colegas.

Com o decorrer do tempo, talvez seja necessário contratar profissionais para essas tarefas, para que os tradutores tenham tempo de traduzir. Esses profissionais custam dinheiro, dinheiro que a cooperativa tem que tirar do bolso dos cooperados, porque da cartola não podem.

Muitas vezes, dá problema. A cooperativa seleciona trinta tradutores competentes para cooperados e, lá pelas tantas, encarrega Alfa de atender um cliente e Alfa, que está entalado com outros problemas, só essa vezinha, repassa o trabalho um lorpa que não é cooperado. Quando terceirizou o trabalho para Beta, Alfa tinha se prometido revisar tudo letra por letra, mas acontece que, pô. E quando acontece que pô, a coisa complica. Então, sai uma porcaria e tem que puxar as orelhas do colega, eventualmente excluir da cooperativa.

Nunca se esquecendo que cooperativa é como vaca: dá leite, mas precisa de capim. E se você entender a cooperativa como uma entidade que te manda serviço, cabe perguntar quem vai conseguir serviço para a cooperativa? Ou você, voluntariamente, entrega todo o serviço que receber de clientes particulares e deixa que a cooperativa retire sua parte e, eventualmente, distribua entre diversos cooperados, ou alguém, lá na cooperativa, é encarregado de vender serviço e remunerado por isso. Caso contrário, primeiro, seca o leite e, depois, a vaca, coitada, morre de fome.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Apostila para o concurso para tradutor juramentado (TPIC) em Minas Gerais


O nosso colega e TPIC em SP professor Dr. Francis Henrik Aubert (USP) preparou uma apostila para o concurso realizado aqui em SP há anos, com modelos exemplos e outras informações úteis para quem vai prestar o concurso para a língua inglesa. Os interessados em adquirir um exemplar devem entrar em contato com ele próprio em fhaubert@hotmail.com.

Não ganho comissão.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Vamos falar de preços?

Neste artigo, que inicia esta série sobre preços e pagamentos, disse que Não existe "preço justo", um preço determinado por uma fórmula matemática regida pela ética. Existe o preço que você e seu cliente combinaram. Essa é a definição jurídica de preço justo: o preço que as partes ajustaram. A definição econômica é o preço normal do mercado.

Normalmente, quem paga acha o preço é excessivamente alto e quem recebe acha excessivamente baixo, mas isso faz parte da vida.

Os preços de tradução são muito dispersos: tem quem receba R$ 0,03 por palavra, tem quem receba € 0,12 – e veja que é uma grande diferença. Menor do que parece, porque geralmente se exige mais de quem ganha mais e, por isso, quem ganha mais produz menos. Mesmo assim, há uma bela diferença.

A dispersão está ligada à segmentação do mercado. Quer dizer, não há um mercado de tradução, há uma infinidade de mercados, cada um com seus preços e suas regras, a maioria não escritas.

A primeira medida a tomar é saber em que segmentos de mercado você se encaixa e com que segmento está lidando. Se você pegar uma agência indiana, não adianta querer cobrar € 0,12 por palavra, porque não vai dar.

Por outro lado, tem o que se chama a "puxadinha": se você quer entrar num determinado segmento, talvez tenha que puxar o preço um pouco para baixo. Por exemplo, se a média for R$ 0,05 por palavra, talvez você tenha que aceitar R$ 4,00 para entrar no mercado.

Isso é absolutamente normal, mas propõe ao menos um problema: como passar dos R$ 4,00 "puxados para baixo" para os R$ 0,05 da média, para os R$ 0,06 "puxados para cima" e, por fim, como passar para um segmento que pague melhor.

Mas disso falamos amanhã.

domingo, 6 de abril de 2008

Amizade e escravidão

Na Reunião na Sala 7 de ontem, uma participante se queixou de que um amigo lhe tinha pedido a tradução de uma longa dissertação e, quando soube que uma tradução daquele tamanho não ia sair grátis, encerrou a amizade, com a acusação de mercenarismo.

Ambos estavam enganados: ela pensava que ele fosse amigo, ele acreditava que ela fosse escrava. Uma incoerência: não se pode ser escravo do amigo nem amigo do escravo. O engano agora está desfeito. Ela agora que aprenda a distinguir quem é amigo de quem é cliente de quem é candidato a senhor de escravos. E ele que vá procurar uma escrava onde quiser. No raio que o parta, preferivelmente.

Traduzir vinte linhas grátis para um amigo é cortesia. Mas trabalhar dias e dias para traduzir uma dissertação e não receber nada é burrice.

Como dizia a Cacilda Becker, não me peça para dar de graça a única coisa que tenho para vender.

Fim de papo.

Preços e pagamentos

Preços e Pagamentos: Melhor Prevenir que Remediar

Este é o primeiro artigo de uma série, que vai ser longa, sobre a remuneração de nosso trabalho. O problema tem dois aspectos, ambos os quais vão ser abordados aqui: quanto cobrar e como evitar a possibilidade de não ser pago. Vou entremear estes artigos com artigos sobre outros assuntos, mas pretendo, publicar ao menos três matérias por semana sobre este assunto. Conto com os comentários e perguntas de vocês todos, para tornar esta série mais útil a todos.

Começo pelo óbvio:

  1. Tudo envolve risco. Toda ação é arriscada e a inação geralmente é mais arriscada ainda.
  2. É melhor prevenir que remediar, ou, para usar um termo mais moderno, é importante ser proativo. Fazer as coisas certo desde o início. O combinado está sempre certo. Fazer tudo por escrito: verba volant, scripta manent, como diziam os romanos.
  3. Se quer ser tratado como profissional, aja como profissional. Profissional (a) age com honestidade e transparência, (b) cumpre o prometido, (c) faz sempre o melhor que pode, (e) não se envergonha de cobrar pelo seu trabalho.
  4. Não existe "preço justo", um preço determinado por uma fórmula matemática regida pela ética. Existe o preço que você e seu cliente combinaram. Não há nada de errado em cotar um preço alto ou mais alto que a média, desde que a cotação seja transparente, desde que o cliente não seja enganado, desde que, na hora de cobrar, você cobre exatamente o que cotou. Cabe ao cliente decidir se que o seu trabalho ou o de outra pessoa que cobre menos.

Amanhã tem mais. Por hoje, chega, que é domingo.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Qual é o certo?

É comum encontrar, nos locais de discussão dos tradutores, alguém perguntando qual é o certo. Pode ser a grafia de uma palavra estrangeira, pode ser o sentido de uma palavra portuguesa, pode ser uma construção, mil coisas.

A discussão rola e começam a aparecer as opiniões contrárias: um cita
Fulano que diz uma coisa, outro cita Beltrano que diz o oposto. Um terceiro cita o Google – e assim vamos. Na maioria das vezes, a discussão é inconclusiva e o perguntador fica muito frustrado. Frustrado, mas tem que terminar a tradução – e terminar no prazo.

A língua, tanto no aspecto lexicológico, quer dizer, no sentido das palavras, como no gramatical, é muito menos monolítica do que se pensa. Se há usos indiscutivelmente errados, como nós vai e há outros indiscutivelmente certos, como nós vamos, falta consenso em mil e um pontos, onde partidos opostos afirmam opiniões diferentes e se comprazem em atirar lama um no outro.

Além disso, a língua muda com o tempo e o que errado ontem pode ser considerado "já aceito" ou "perfeitamente correto" hoje. O mais divertido é, entretanto, que o que hoje é "errado" já foi considerado certíssimo.

Quer uma prova? Vá dizer, hoje, estava meia louca ou estavam meios loucos e vão te repreender, afirmando que meio aqui funciona como advérbio e, portanto, não tem flexão de gênero nem de número: diz-se, em bom vernáculo, estava meio louca, estavam meio loucos.

Pena que não combinaram essa regra com Camões: Onde os outros meios mortos se afogaram (III, 116), Uns caem meios mortos (III, 50); nem com Vieira: Aqueles samaritanos eram meios fiéis e meios gentios; nem com Júlio Dinis: Mas, antes de receber resposta divisou por entre a porta meia aberta o rosto pálido de Daniel (Pupilas). E por ai vamos, mesmo sem citar os brasileiros. Há exemplos de sobra.

Nem por isso vou começar a dizer a tradução já estava meia completa, porque, nos dias de hoje, a construção não é mais aceita.

Muitas vezes, também, a construção mais "correta" é anormal e ficamos entre a cruz e a caldeirinha: Conte-me a verdade, meu filho é o que diz a gramática, me conte a verdade, meu filho é o que a maioria de nós diria. Aqui, ainda dá para sair pela tangente, com um conte para mim a verdade, meu filho –mas não faltará quem corrija a regência, transformando nosso exemplo em conte a mim a verdade, o que, ao menos, é mais natural que o conte-me a verdade.

Mas nem sempre há uma boa saída que soe natural e seja incontroversa.

Se fosse fácil, ser tradutor não tinha graça.

Aqui abaixo tem o convite para a Reunião na Sala 7. Grátis, via Internet, leia e apareça lá.