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quinta-feira, 16 de julho de 2009

Por que Somos Odiados?

Falou o Igor Medeiros, num comentário a este tópico:

O seu desemprego é inevitável. A tecnologia não para de evoluir. A Microsoft está usando uma ferramenta de tradução de suas páginas de suporte para várias línguas e só me dei conta disso depois de ler uma página quase que inteira e no final notei um pequeno erro se sentido no emprego das palavras. Pesquisei e descobri que a tradução foi feita por máquina. Fiquei impressionado. Falta pouco para traduções perfeitas. Quer uma sugestão? Faça um curso profissionalizante enquanto tem tempo.

Este foi um dos comentários menos azedos e agressivos dos muitos deixados naquele tópico. Ao menos, é educado e escrito em bom português, o que não se pode dizer de muitos dos outros, certamente postados por semianalfabetos.

Mas mal oculta um tanto do que se chama em alemão Schadenfreude, a alegria com a desgraça dos outros: você vai perder o emprego, laralalááá! Eu vou manter o meeu! E seeem vocêê! laralaláá.

Vá lá, leia os outros comentários e veja o veneno.

Por que somos tão odiados? Somos a ponte que transpõe o abismo linguístico e conduz a um conhecimento que, sem nós, seria inatingível. Ou levamos o produto (seja um serviço, ou um produto intelectual ou produto físico) a regiões que, sem nós, seriam inalcançáveis. Mas somos vistos não como a ponte que viabiliza a passagem, mas sim como a barreira que a impede.

E como se detesta pagar tradutor! Paga-se tudo: chope, cigarro, chocolate, pintor, encanador, advogado, aluguel, prestação - mas tradução a turma quer grátis. O sujeito tem um professor de inglês e paga as aulas direitinho, mas fica surpreso quando o professor quer cobrar por uma tradução.

No meu tempo de orkuteiro ativo, tinha um perfil que me identificava como tradutor e uma participação em uma comunidade de tradutores. O que eu recebia de solicitações de tradução grátis, de gente que eu nem conhecia, era uma barbaridade. Se eu fosse fazer tudo aquilo grátis, não tinha um momento para mais nada na vida. E todos os pedidos tinham uma boa justificativa: era para a escola, era só uma música, era só… Mas, ainda que mal pergunte, por que eu vou trabalhar grátis, quando posso fazer serviço remunerado, e ficar com menos dinheiro no bolso para os outros ficarem com mais dinheiro no bolso deles?

Por que, para pagar o tradutor, nunca se tem dinheiro? Comprou roupa, tomou chope, foi na balada. Para o tradutor, bom, aí… Por acaso, na loja de roupas, no boteco, na balada, eles dão desconto "porque é para a escola"?

Quanto à tradução automática de que fala o Igor, sim, melhorou muito e está melhorando constantemente e essa melhora vai provocar muitas mudanças na nossa profissão. Sobre isso, falo amanhã, porque, por hoje, é só. Obrigado pela visita.

11 comentários:

Petê Rissatti disse...

Fiquei indignado com as respostas ao tópico (que infelizmente havia perdido). São um punhado de cenossões que não fazem a mínima ideia do que é tradução (e de como a gente se esfalfa para ganhar nosso pão) e o pior de tudo isso: é regra, não é exceção. Quando digo "sou tradutor", geralmente me olham com aquela cara de "nossa, o que você faz da vida?". E nem sabem que o livrinho do Harry Potter que eles carregam tem a mão da Lia Wyler. Se haverá mudanças, claro que haverá, como em toda a profissão que tem tecnologia envolvida. O que acho mais absurdo é eles chegarem até aqui, como ridículos anônimos, e escamarem o blogue. Paciência, é a democracia. E que aprendam que tradutor de verdade também custa.
Abraço.

Paulo piglet Leitão disse...

Caro Mestre

Como vc bem colocou, somos odiados porque fazemos a intermediação entre duas partes que dependem de nós para se comunicarem. E ninguém gosta de dependência.
Minha experiência pessoal: Em 1984 eu ainda era agrônomo quando fui aos isteites com um grupo pelo Rotary. Supostamente todos os 5 participantes deveriam ter passado por um exame de fluência no inglês para aproveitar plenamente a experiência, mas na prática só eu "dominava" o idioma. Acabei virando intérprete da turma durante 45 dias em Nebraska e Iowa. [Foi aí que decidi abandonar a profissão de professor de agronomia na Unesp e me inscrever na Alumni pra virar tradutor/intérprete "de verdade"]
Voltando ao assunto deste blog: Um dos companheiros desenvolveu um ódio mortal contra o poor me porque mal conseguia ir ao banheiro sem minha ajuda. Era um cara cheio de idéias, agrônomo-chefe da carteira agrícola de um grande banco, mas dependia de mim para expor suas ideias e para entender o que os americanos estavam nos mostrando. Essa dependência gerou um ódio irracional e é desse ódio que estamos falando agora. Parafraseando o Primeiro Pedrão: "Dependência é a morte".

Paulo piglet Leitão

Danilo Nogueira disse...

Tibi gratias ago, Porcelle! Bene dixisti! Para quem não sabe, o Paulo Leitão, conhecido entre os amigos por "Piglet" ou "Porcellus" é tradutor calejado. As brincadeiras com o sobrenome dele são muits e ele próprio, bem-humorado, se apresenta como Paul Piglet. Tem um outro sobrenome, absolutaente impronunciável, mas isso é outra coisas.

Como é TPIC, dizem que suas especialidades são porcurações e pedidos de habeas porcus. Um bom e velho amigo, que me dá muito prazer ver aqui.

Danilo Nogueira disse...

O Petê Rissatti, enfant terrible da tradução, que resolveu aprender alemao, quando já razoavelmente adulto, e conseguiu uma bolsa para ir às Alemanhas conhecer o pedaço e outro bom amigo que fiz nesta profissão.

Tem gente que nos detesta, tem sempre os cenossões, mas também tem muita gente boa.

Felipe disse...

Olá, sou aluno do último ano de tradução pela UNESP/SJRP e comecei a acompanhar o blog esses dias. Já me sinto aterrorizado com o panorama da profissão, tanto que estou nessa de prestar concursos públicos. Voltando ao assunto, é incrível como ninguém respeita o que a gente, tão arduamente, estuda e pratica, pois apesar de ainda não haver terminado já faço uns bicos por aí. Sempre que puder dou uma passadinha aqui pra aprender algo novo. Até!

Igor Barca disse...

Ainda bem que ainda não tive que enfrentar esse ódio. Espero que ele nunca venha. Ou virá?
Quanto à vontade de pagar tradutor, já enfrentei certos problemas, pois sempre querem que eu combre um preço extremamente baixo, com as justificativas de que "é só uma página", "é muito fácil", "é só colocar num tradutor automático e ajeitar" e etc.

Igor Barca
www.traduz-se.blogspot.com

Ernesto Diniz disse...

Com certeza o panorama é ruim, mas a ruindade da coisa acontece em zilhares de outras profissões. Claro, ser tradutor é ter coragem e pulso firme, pra ser "antipático" e cobrar justamente pelas traduções e correr atrás de cliente que está "fechando com o outro 'cliente' a demanda para poder pagar a tradução", enfim, é a realidade da prática. Mas não podemos parar no discurso dos não-especialistas, dos leigos; quem é tradutor profissional (como você bem faz aqui nesse espaço, Danilo) tem que marcar posição e defender a profissão.

Abraço!

Anônimo disse...

Isso é um problema sócio-cultural, torna-se uma grande barreira para diversas áreas do conhecimento e afeta muito, principalmente em sociedades subdesenvolvidas como o Brasil. Infelizmente não há como, de um dia para o outro, mudar esse atraso intelectual generalizado. É comum a concepção subdesenvolvida gerar desvalorização de certos esforços intelectuais, como por exemplo a tradução, em detrimento de outros valores mais característicos da cultura.

Danilo Nogueira disse...

Sei não. Estava agora mesmo batendo papo com alguns colegas alemães e ingleses e eles se queixam dos mesmos problemas por lá. Mesmo nos EUA, onde a ATA faz um obaoba (oba-oba? oba oba? Ainda não estou firms nos hífens), a turma não tem tanto prestígio assim.

BeteKoe disse...

Danilo, só posso confirmar o que os colegas alemães te disseram. A coisa aqui não é muito diferente. Talvez haja um pouco mais de profissionalismo nas empresas, mas nem sempre. E com a tal da crise, acho que as coisas ainda pioraram.
Ontem mesmo, me liga um cliente e pede para "dar uma olhadinha" numa versão feita por um estagiário. Versão não é bem a minha praia, mas o cliente é antigo, dos bons, e queria minha opinião. Eu abri o arquivo, um contrato de quatro páginas, e constatei que a "olhadinha" ia virar uma revisão das boas. Falei com o cliente, que resolveu me pagar para fazer a versão final e ainda comentou: "era melhor ter mandado logo para você, mas achamos que não seria preciso". Pois é...

Danilo Nogueira disse...

Pois é, Bete. A turma aqui vive dizendo que aí na Europa é diferente, mas é mais ou menos a mesma coisa em todo lugar.

Mas você conseguiu ensinar ao cliente, o que é importante. Sorte que o serviço era para o alemão e o cliente entendia alemão. Porque, por exemplo, se fosse para o português, o cliente alemão talvez não fosse acreditar que o rapaz brasileiro não era capaz de fazer uma tradução para sua própria língua.