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quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Circularidade em dicionários

Os filósofos da escola cética afirmavam que o conhecimento é um círculo vicioso: para provar qualquer afirmação, é necessário fazer outras afirmações, as quais, por sua vez, carecem de prova, que se faz com outras afirmações e, no devido tempo, voltamos ao ponto de partida. A isso, chamamos dialelo em português, de diallelon em grego.

Esse fenômeno não afeta os dicionários bilíngües, mas é particularmente notável no caso dos monolíngües. Escolha qualquer palavra e o dicionário vai dar uma definição na qual, muitas vezes, vai usar um termo semanticamente homólogo ao termo definido. Por exemplo, o Aurélio, diz que, entre outras coisas,

tradutor: Que ou aquele que traduz.
tradução: Ato ou efeito de traduzir.
traduzir: Transpor, trasladar de uma língua para outra.

Poderia ter definido traduzir como fazer uma tradução, o que não seria errado, mas ia criar um circulo vicioso, do qual se livrou com o uso de transpor e transladar. Se formos procurar transpor e transladar, vamos chegar a outros grupos de verbetes e assim por diante. Há um limite para isso: vamos inevitavelmente nos aproximando de um número reduzido de palavras e, lá pelas tantas, forma-se um círculo vicioso em que cada pouco voltamos a um verbete já consultado. Embora um dicionário grande sempre ofereça várias definições para várias acepções e, de certo modo, disfarçar o problema, uma olhada na definição de existir e existência do Aurélio ou do Houaiss exemplifica a dificuldade.

Alguns dicionários monolíngües muito pequenos, para aprendizes iniciantes, simplesmente não definem esses termos: espera-se que o usuário já os conheça e dispense definições. Essa é a única solução, aliás, a mesma usada por Euclides na sua geometria: há um pequeno grupo afirmações basilares que não são demonstradas.

Uma solução, entretanto, considerada inaceitável para dicionários de grande porte: quem abre um dicionário grande, espera encontrar definições para coisa, existência, ser e outros termos semelhantes, membros de um grupo difícil de tratar sem cair em círculo vicioso. Em outras palavras, um tanto de circularidade é inevitável nos dicionários mais completos. Entretanto essa circularidade é somente admissível no núcleo definitório do dicionário. Fora daí, cabe ao dicionarista fugir aos círculos viciosos, usando ou a técnica mostrada acima, ou alguma das outras que os lexicógrafos competentes conhecem.

Lamentavelmente, há muitos dicionários, até lá com sua fama, onde esses círculos viciosos ocorrem onde não seria de admitir. Por exemplo, aqui, há um interessante artigo, escrito por um português, que menciona um dicionário onde prostituta é definido como uma mulher que se entrega à prostituição, prostituição se define como o acto de prostituir-se, e prostituir-se fica definido como entregar-se à prostituição. Uma série absolutamente perfeita em sua inutilidade.

Parece que estou conseguindo voltar ao ritmo de postar todos os dias. A ver se consigo manter a andadura. Já que está aqui, dê uma olhada aqui para ver os cursos a distância para tradutores via Aulavox.

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