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segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Carta aberta ao SINTRA

À colega
Elizabeth Lélia Thompson
Presidente do SINTRA — Sindicato Nacional dos Tradutores

Prezada colega,

Repassaram-me ontem a mensagem eletrônica reproduzida ao final deste texto, que pretensamente é de sua autoria. Se não for, por favor, me desculpe, mas tem toda a aparência de ser. Achei que o assunto é tão relevante que merecia uma "carta aberta", que vai aqui.

As informações contidas na página de Valores Praticados do SINTRA, na sua forma, talvez violem alguma disposição de algum diploma legal, mas é impossivel acreditar que, no seu conteúdo, configurem formação de cartel e espero que as autoridades percebam o fato. A última coisa de que necessitamos agora é uma encrenca com a lei.

Não creio que formação de cartel seja delito que se anuncie aos quatro ventos, como o SINTRA faz há anos com os valores praticados. Só a publicidade dada aos Preços Praticados, a meu ver, já faz muito por descaracterizar o delito. Cartel é coisa que se organiza ao pé do ouvido e por meias palavras, preferivelmente sem sombra de documentação.

Cartel também é coisa de pequenos grupos com forte organização: carteis, oligopólios e oligopsônios são lobos da mesma alcateia. Mas somos milhares de tradutores, muitos simples biqueiros, que fazem da tradução uma fonte de renda subsidiária; outros tantos são "tradutores transitórios", gente que "pega" uma tradução, mas depois "arranja um emprego" e nunca mais volta a traduzir nada; — fora os que traduzem "por amor" e aceitam ganhar nada ou quase nada, porque têm outra fonte de renda que lhes garante o sustento, estes, normalmente, gente do mundo acadêmico.

Além disso, como há muito mais gente querendo traduzir (ou achando que quer) do que serviço de tradução disponível, o mercado é dominado pelos compradores e todo tradutor que esteja no mercado há mais que uns poucos meses já ouviu o famoso "não falta quem faça por bem menos que isso". Fazer cartel em mercado dominado pelos compradores é impossível por definição.

Os tais Preços Praticados são, na verdade, mais um ideal, aquilo que gostaríamos de receber, do que uma realidade. Poucos conseguem chegar lá. Eu consigo sem grandes esforços, mas tenho 40 anos de tarimba e sou um especialista numa área que sabidamente paga bem.

Temos ainda de lembrar que muito — caso não a maior parte — do serviço que roda por aí é intermediado por agências e muitas das agências brasileiras ou cobram de seus clientes os Preços Praticados do SINTRA ou até oferecem algum desconto como incentivo. Sabe, aquela história do "estou te cobrando 10% menos que a Tabela do Sindicato". Como repassam o serviço ao tradutor final, necessariamente ficam com uma parte do pagamento como ressarcimento de suas despesas e lucro e, por menos que retivessem, não poderiam jamais pagar ao tradutor propriamente dito o tal do Preço Praticado.

Outras agências vivem de repasses de agências estrangeiras, por exemplo, de agências dos EUA que tomam enormes serviços a serem traduzidos para várias línguas e retalham o trabalho entre várias agências de outros países, inclusive Brasil. Atualmente, com o real nas alturas, os preços praticados no exterior são inferiores aos praticados aqui. Nem que quisessem, essas agências poderiam praticar os preços preconizados pelo SINTRA.

O caso das editoras, que representam uma parte muito visível porém menor do nosso mercado é interessante: embora algumas editoras de elite estejam se aproximando lentamente dos Preços Praticados (Haleluia!), a maioria está bem longe deles.

Realmente, ver cartel aí, exige um grande esforço de imaginação.

Não sei se ajudei alguma coisa ou se piorei a situação.

Danilo Nogueira

A mensagem pretensamente do SINTRA é esta:
Caros colegas,
O Sintra está sendo investigado por possível formação de cartel, pela divulgação da nossa lista de valores de referência.
A Secretaria de Defesa Economica abriu um processo administrativo acusando-nos disto. Estamos na fase do final da instrutoria do processo e na segunda feira mandaremos as alegações finais (de defesa), para corroborar ainda mais que o Sindicato publica sim uma lista de preços, mas que esta lista de preços não é impositiva nem para os filiados nem para as empresas que contratam tradutores, solicito a ajuda de todos vcs que nos mandem emails dizendo que vocês usam a lista apenas como base mas que a palavra final, o acordo, é feito entre vcs e a empresa que contrata o serviço.
Queremos anexar os e-mails como prova que o Sindicato não impõe os preços apenas os sugere.
Obrigada a todos pela ajuda
Elizabeth

Um comentário:

denise bottmann disse...

é, teria que ver. bem estranho, não faz muito sentido.

sempre aqui um adendo de quem faz tradução para editora: faz anos que várias editoras pagam acima dos preços sugeridos pelo sintra. posso lhe assegurar que, nos últimos dois anos, as seis editoras para as quais traduzi algum livro pagavam acima dos valores da tabela do sintra.
em 2009, em duas editoras foi BEM acima e em outras duas foi MUITO acima. e faz algum tempo que penso em escrever para o sintra pedindo para atualizar a tabela, que está realmente defasada para baixo. neste sentido, funcionaria como um péssimo cartel contra os tradutores editoriais.

outro pepino nessa tabela do sintra é o equívoco "direitos autorais à parte" - pela lei atualmente vigente, a remuneração de tradutor editorial é sempre por cessão dos direitos autorais (patrimoniais).