A revisora, extasiada e triunfante, corrigiu o meu erro, debaixo do nariz do cliente: uma vírgula antes de etc. Explicou que etc. era abreviatura de et caetera (como se eu não soubesse!) que, em latim, significava e outros. Como não se usa vírgula antes da conjunção e, ipso facto não se pode usar antes de etc.
Bonita dedução, mas não faz sentido. Sempre achei muito interessantes essas regras autógenas. De onde saiu está essa regra? A revisora não sabia, mas afirmava que era simples lógica.
Lógica?
Uhm… talvez. Mas nas Instruções para a organização do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, Aprovadas unanimemente pela Academia Brasileira de Letras, na sessão de 12 de agosto de 1943, que, com algumas alterações relacionadas ao uso de acentos, ainda se encontram em vigor. Nas Instruções, etc. aparece 145 vezes, 18 das quais precedida de ponto-e-vírgula; as outras 127, precedida de vírgula. Você acha que a ABL cometeria o mesmo erro 127 vezes em um texto de menos de sete mil palavras?
Com a ABL estão os manuais do Estadão e da Presidência da República.
O Manual de Estilo da SECOM nos lembra: "Embora haja divergências entre os gramáticos, usa-se vírgula antes do etc. Assim o entendem Luft e Aurélio. Houaiss, na introdução ao seu dicionário, esclarece que por desnecessário, não se usou de vírgula antes de etc. — a não ser que houvesse alguma causa precípua para tanto."
O Manual de Estilo do Senado Federal não usa vírgula antes de etc. Os manuais de estilo da ECA-USP e da Zahar às vezes usam, às vezes não usam, sem critério que eu perceba.
Quer dizer, não é uma regra. Pode ser uma preferência estilística, pode até fazer parte do manual de estilo de uma determinada editora ou instituição, mas regra, não é - e usar vírgula antes de etc. não é erro.
quinta-feira, 19 de março de 2009
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5 comentários:
Ja tem tanta virgula nessa nossa lingua, tanta regra e as pessoas ainda querem inventar outras?
Pois é, Arina. Acho que é um pouco de vontade de encontrar pelo em ovo.
O problema é que muitos revisores e tradutores simplesmente se enxergam, no ato de revisar o trabalho alheio, em posição superior e, pra mostrar trabalho, como o Danilo pontuou, fazem de tudo pra encontrar pêlo em ovo. Isso à pecha de regras tautológicas. É uma pena.
Muito bom você narrar a sua história. Assim outros tradutores percebem a "importância" dos pêlos, estejam eles nos ovos ou não.
O mesmo se aplica aos que analisam testes para as agência: tem uma turma que muda o que está certo, só para derramar sobre o texto uma torrente de vermelho.
Realmente, essa vírgula antes de "etc." dá o que falar. No entanto, o que eu costumo ver e muito é o pessoal misturar à vontade os variados sabores, [ etc / etc. / , etc / , etc. ], tudo em um mesmo texto. Acho que é o caso de um esforço extra para padronizar e dar um tom profissional ao trabalho, até mesmo nos mínimos detalhes. Existem pêlos e pêlos nos ovos. E muito do nosso trabalho de tradutores (e da própria gramática em si) é feito de detalhes.
E falando em vírgula, tem uma outra que vive sendo excomungada (para entrar num termo da moda), tendo visto negado, expulsa e exterminada: a vírgula para separar sujeitos. Tem sentença que, ah, vá lá... Mas tem umas em que é absolutamente necessária. O que acham disso, prezados colegas?
Ass.: Dorival Santos Scaliante
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