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sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Concurso para Tradutor Público ("juramentado) no Rio de Janeiro

Estão girando pela Web mensagens iradas sobre os concursos para TPIC recentemente promovidos no Rio de Janeiro, Minas Gerais e Santa Catarina. Para dizer a verdade, eu já esperava. É sempre assim: quem passa, elogia o concurso; quem não passa sempre encontra um advogado pronto a jurar que um mandado de segurança garante a nomeação e é "causa ganha". Isso faz parte da vida e da própria cultura brasileira. Tapetão está aí para ser puxado, como todos sabem.

Mas parece que, desta vez, a coisa foi feia. Vou me deter aqui somente em um ponto do concurso do Rio: segundo se diz — e eu ainda não tive como apurar a origem da denúncia — foi usado um gabarito de correção. Ou seja, para cada texto, haveria uma "tradução padrão" e os desvios dessa tradução teriam sido punidos com descontos de pontos. Se isso aconteceu, foi um crime. Não sei como a lei tipificaria esse desatino, mas foi um crime hediondo que vai deixar uma mancha, uma grande nódoa na reputação de quem o cometeu.

Só cabe gabarito em teste de múltipla escolha e os exames da JUCERJA não foram testes de múltipla escolha nem cabe esse tipo de avaliação em exame de tradução. Só isso desqualifica completamente o concurso, aos meus olhos.

Sei de uma pessoa que foi aprovada e sei que é profissional séria e competente. Conheço muitos dos reprovados e fico me perguntando o que terão feito para merecerem a reprovação, porque são gente conceituadíssima. Em qualquer concurso, sempre há uns tantos "conceituados reprovados", ou porque estavam em mau dia, ou porque gozavam de conceito imerecido. Parece, entretanto, que o número de reprovações de gente conhecida e respeitada na primeira fase do teste excede o que se poderia esperar.

Quer dizer, há algo errado, muito errado. As informações estão pipocando de cá e lá e ainda é cedo para termos certeza de alguma coisa. Mas, ao menos, essa história do gabarito precisa ser tirada muito a limpo. Por primorosa que seja a tradução do gabarito, o sistema é absurdo.

Ainda devo voltar ao assunto muitas vezes, talvez menos do que ele mereça.

Post scriptum: mal tinha publicado este artigo, me escreveu um colega que diz que as coisas não são bem assim. Não pode dar detalhes agora e pede que eu nome seja mantido em segredo. Diz que vai escrever mais  tarde e, sendo quem é, tenho certeza de que não vai faltar. Vamos ver o que acontece. Estou adicionando este PS para deixar as coisas tão claras quanto possível.  



A ideia é publicar mesmo os comentários anônimos, desde que estejam dentro do que eu próprio considerar os limites da seriedade. 




13 comentários:

Anônimo disse...

Olá Danilo,

Por enquanto, gostaria de me manter anônima, mas eu passei no concurso do Rio e gostaria de dar minha impressão. Minhas provas não foram exatamente iguais ao gabarito, mas foram consideradas suficientemente boas. O que quero dizer é que o "gabarito" foi, provavelmente, apenas um guia, uma orientação, enquanto a correção foi muito mais cuidadosa, contemplando outras opções, em todos os quesitos, igualmente corretas. O que parece estar acontecendo são reclamações do edital, que, agora, convenhamos, já não procedem mais. Quem estava insatisfeito com o edital e a forma do concurso deveria ter se manifestado antes, pelo menos é assim que vejo. Acho que todos têm o direito de pedir revisão ou recontagem dos pontos, está previsto em qualquer concurso. Mas devemos também lembrar que este concurso e seu edital eram severos: em alguns casos, um erro significava desconto de 0,5 ponto. Para reclamar, é preciso conhecer bem o edital.

Anônimo disse...

Caro Danilo,

Estamos todos chocados aqui no RJ. A prova de tradução estava fácil. Era um trecho de contrato (que no gabarito eles chamaram de "acordo") do tipo água com açúcar, exceto pelo título de uma das cláusulas - "Call out Fees", que eles chamaram de "taxas de convocação". No entanto, mesmo para a prova de tradução, os resultados foram desastrosos. Colegas muito competentes tiraram notas baixíssimas, justamente, no feijão com arroz.

Já a prova de versão estava difícil por se tratar de texto literário, mas não impossível.

Além das notas conferidas para cada parte, eles disponibilizaram as imagens da nossa prova tal como a entregamos, sem nenhuma marca de correção, junto com o respectivo gabarito. Assim, pelo fato de terem nos mostrado as provas sem as marcas de correção, juntamente com o respectivo gabarito, todos suspeitamos que este tenha sido usado como critério de correção.

Hoje liguei para a FGV e a atendente me contou que 956 tradutores fizeram a prova de inglês. Quando perguntei quantas pessoas efetivamente corrigiram as provas, ela me disse 3 pessoas (!!!). Depois hesitou um pouco. Então, não é caso de se pensar que usaram o gabarito para fazer uma correção a toque de caixa e depois corrigir as provas de maneira decente apenas daqueles que interpuseram um recurso?

Teresa

Anônimo disse...

Eu gostaria de saber ao menos o idioma da tradutora (ou tradutor) que não se identificou. Será que é alemão?

Creio que essa informação é importante para o caso, pois inglês e espanhol foram as qualificações mais procuradas e para essas duas especialidades as reclamações foram as mesmas. A suspeita do gabarito se aplica precisamente ao grande número de candidatos. Não se pode dizer o mesmo para todos os idiomas procurados.

Anônimo disse...

Para exemplificar, o que disse no post anterior, apenas 3 candidatos passaram nas provas de espanhol e apenas 31 nas de inglês. Como não achar estranho que apenas 3 candidatos tenham passado nas provas de espanhol e apenas 31 nas provas de inglês?

Ademais, dos 31 que passaram para inglês, salvo por três exceções (8, 8,25 e 7,25), todos tiraram a mesmíssima nota na versão, ou seja, 7.

http://200.198.188.123/download/provas/jcrj09_do_20091106.pdf

Anônimo disse...

Me parece que a mera existência de um gabarito, mesmo que sirva "apenas" como uma "orientação", já constitui algo de muito grave.
Até agora, pude ver as provas de alemão, inglês, francês e espanhol. Resumidamente (a partir de uma passada de olhos no gabarito): o gabarito da tradução de inglês continha alguns erros elementares ("agreement", por exemplo, traduzido por "acordo" num contexto em que só poderia ser "contrato"); o gabarito de francês continha, inclusive, "anomalias" da língua portuguesa (tais como uso excessivo de gerúndios, típico de empréstimos da língua francesa), além de aviões que "se acidentam" (teriam agora os aviões vontade própria?), veículos "assegurados" ao invés de "segurados", etc.; o gabarito de espanhol talvez tenha sido o menos problemático - parece que o que gerou a insatisfação dos candidatos foi mesmo a correção da versão, que privilegiou a vertente latino-americana do idioma; por fim, no gabarito de alemão, fora uma ou outra opção da qual discordo (por exemplo, uma tradução literal de "ein" e "eine" - algo como o "your" inglês, que pode ficar de fora da tradução, quando usado excessivamente, e que torna o texto deselegante, ao meu ver), pelo menos, sabia-se o que era "segurado", "parágrafo", etc.
Outra coisa que me chamou a atenção foi a existência de critérios distintos para a elaboração e posterior correção da prova de versão: no caso do francês, por exemplo, o gabarito foi um trecho realmente vertido ao francês de "Memórias do Cárcere", de Graciliano Ramos, publicado pela editora Gallimard, enquanto nos outros idiomas foi utilizada uma versão feita para a ocasião.
Claro que muita água ainda vai rolar... De um lado, temos a massa (quase 99%) de reprovados que vai lutar pela anulação do concurso. Do outro, 1% de aprovados que certamente se sentirá injustiçada se o concurso for anulado e que tem todo o direito de lutar para que o resultado se mantenha...
Ainda há personagens secundários nessa história... há três ou quatro cursos de idiomas que prometiam preparatórios para a segunda fase... com 32 candidatos aprovados, será que vale a pena abrir turmas? Acho que não, o que significa que tem muito dono de curso que vai deixar de faturar (as turmas preparatórias para a primeira fase estavam lotadas!) nesse final de ano...
E, por fim, como explicar que um curso de renome como o da PUC - gostem ou não, ainda é o melhor curso de formação de tradutores - tenha aprovado um único aluno?
Por tudo isso, só me resta dizer que "Something is rotten in the state of Denmark"...

Anônimo disse...

Corrigindo a informação anterior: foram 32 candidatos aprovados na prova de inglês. Havia mais um nome na página seguinte do Diário Oficial que eu não tinha visto, o que não muda em nada a desproporção dos aprovados.

Menos de 4%?

Anônimo disse...

Danilo e demais colegas,

Concordo com o primeiro comentarista quando diz que as reclamações quanto ao edital não procedem mais. Tampouco desejo argumentar quanto ao número de aprovados. É certo que um concurso para Tradutor Público não é para quem começou a aprender inglês ontem e mal passou do "the book is on the table".

O que, em verdade, se afigura escandaloso, é que os supostos erros não são indicados na prova nem em lugar algum. Como pedir revisão de forma "objetiva", tal como diz o edital, se não há especificação de qual, ou quais, foram os erros?
Vale ressaltar também que, ao acessarmos a prova digitalizada, esta se apresenta sem marcas de correção, o que dá margem a suspeitas, por parte de alguns tradutores, de que muitas provas sequer foram lidas, ou que, se o foram, tiveram sua correção limitada pelo dito gabarito.
Conquanto eu reconheça a competência e o esforço dos aprovados, salta aos olhos a falta de lisura na correção das provas. Somo-me aos colegas que estranham o fato de pessoas de notório saber terem, inclusive, obtido grau ZERO na prova.

Cordialmente,

Valeria.

Anônimo disse...

Oi, sou TPIC em Curitiba há 21 anos, não fiz o concurso. Por curiosidade, li a prova.
Absurdo -10: texto literário na versão. Eu seria reprovada com louvor, sem a menor dúvida.
Absurdo 1: Uma página de contrato picada em pedaços. Início, depois pula um tanto, depois pula outro trecho. E na maior pegadinha, a tal "call out fee", há referência a outro trecho do contrato que não está lá para o candidato se contextualizar.
Eu ignorava totalmente essa expressão. Acho que teria usado "taxa de disponibilidade" e não "taxa de convocação" como dizem estar no gabarito. Pesquisando, concluo que é o que (pelo menos em Curitiba) chamamos de "taxa de visita" de um eletricista, encanador. Mas eu ia me embananar mesmo que já soubesse disso porque "taxa de visita" de um equipamento não ornaria muito bem!
Adoraria ver o gabarito de inglês!
Raquel Schaitza

Anônimo disse...

Essa expressão 'call out fees' foi uma baita pegadinha. Ao chegar à casa procurei em todos os meus dicionários e não encontrei nada. No gabarito eles adotaram "Taxas de Convocação". Eu achei estranhíssimo porque equipamentos não são convocados. Eu tinha pensado em taxas de uso, porque depois o texto falava em equipamentos em uso ou ociosos. Em suma, o gabarito de tradução estava estava muito ruim. A própria palavra "agreement" foi traduzida por "acordo" em um contexto em que contrato era a melhor opção.

denise bottmann disse...

minha solidariedade. não entendo de juramentados, nem de terminologia mais técnica ou cartorial, mas, pelos comentários aqui postados, parece indubitável que a fgv falhou redondamente no conceito básico da coisa.
uma das razões para o adiamento do concurso tinha sido porque a junta estava trocando de organizador das provas. uma curiosidade: qual é a experiência anterior da fgv em concursos na área de tradução?
o pessoal da área vai pedir anulação? pedir uma liminar, pelo menos, um mandado, algo assim? não deve ser difícil. índice de 3% de aprovação em inglês é inacreditável. e pensar que quem traduziu o tal agreement da prova por acordo terá tido nota melhor do que quem usou contrato, é de doer. nem a junta poderia aceitar tais critérios...

Anônimo disse...

Considerando tudo o que li até agora, parece-me que houve diferenças na correção das diferentes línguas.

Fui aprovada na prova de alemão e posso afirmar que havia uma infinidade de soluções diferentes do gabarito nas minhas provas. Isso me chamou a atenção principalmente na prova em que a minha nota foi muito melhor do eu esperava. Eu jurava que algumas das coisas que usei, na falta de um dicionário, seriam consideradas erradas, mesmo indicando que eu tinha compreendido o conteúdo no original. Não foram.

Anônimo disse...

Outro dado estranhíssimo. Dentre os 32 aprovados nas provas de inglês e espanhol a esmagadora maioria passou raspando na parte de versão. De um modo geral, os candidatos de todas as línguas tiveram notas suficientes para boas, mas não ótimas. Por que só os dois candidatos de polonês tiram 10 em traduçao e versão, contrariando todos os candidatos de todas as demais línguas. Seriam eles brilhantes tradutores, com capacidade muitíssimo acima dos demais ou suas provas teriam sido corrigidas de maneira diferenciada. Apenas 2 candidados com nota 10 em ambos os quesitos é algo para se pensar.

Guilherme Pinto disse...

Li Esopo e sei que tais uvas costumam ser verdes demais para raposinhas pretensiosas (FYI ``Yours Truly``, entre elas), ingênuas ou meramente pretensiosas que se candidatam “beyond the threshold level of avowed proficiency”!
A reprovação em massa vem assim nivelar os eventualmente ótimos e os eventualmente péssimos - quase todos bombados! Yes, we are fake! Está claríssima a mensagem, aos olhos preclaros da FGV, que não passamos de enganadores. E dizer que há por aí tradutores não juramentados, a fazerem o trabalho braçal (isto é, traduzir) em seguida submetido ao trabalho carimbal (oficial) daqueles já verdadeira e convenientemente juramentados! Teresa se deu à tarefa de investigar quantas pessoas efetivamente corrigiram as provas: 3 (três!) e desconfia que o gabarito permitiu a correção a toque de caixa para depois corrigirem as provas de maneira decente apenas daqueles que interpuserem recurso! Cabe indagar também: quem são esses 3 doutores? Tradutores efetivamente juramentados, docemente constrangidos por chutarem para escanteio a possível concorrência? Ou meros estagiários das faculdades de idiomas da UFRJ ou da UFF? No primeiro caso, teríamos uma banca “top”; no segundo, uma banca de underdogs! Qualquer das hipóteses causa estranheza!

Alguns comentários acima puseram o dedo na impensável (nos dois sentidos) ferida: “CONTRATO” é chamado, no gabarito, de “ACORDO”. E a correção das provas se deu contra gabaritos. Como se não existe a sinonímia! Como se houvesse uma única possibilidade paradigmática para a tradução de um textos! Como se "gosto de você" não pudesse ser traduzido ora por "I like you", ora por "I am fond of you" - para dar um exemplo, eu espero, à altura da proficiência dos organizadores deste controvertido concurso. Outras bizarrias:
(i) 29 dos 32 que passaram em inglês tiraram a mesmíssima nota 7 na versão – ou seja, a NOTA MÍNIMA!
(ii) O gabarito de francês contém anomalias da língua portuguesa, como o abuso de gerúndios, típico de galicismos (além de aviões que "se acidentam" - tem agora os aeroplanos vontade própria?, veículos "assegurados" ao invés de "segurados", etc.)
(iii) critérios distintos para a elaboração e posterior correção da prova de versão: no caso do francês, por exemplo, o gabarito foi um trecho realmente vertido ao francês de "Memórias do Cárcere", de Graciliano Ramos, publicado pela editora Gallimard, enquanto nos outros idiomas foi utilizada uma versão feita para a ocasião.
(iv) como escreveu Valéria, pareceu faltar lisura na correção. Como explicar o fato de candidatos de notório saber e competência terem obtido ZERO nas provas?
(v) Recado ao Dr. Carlos Ivan Simonsen: foi redondamente falacioso o conceito básico deste concurso. Só cabe gabarito em testes de múltipla escolha; os exames da JUCERJA não foram testes de múltipla escolha, nem cabe esse tipo de avaliação em exames de traduções. Só isso desqualifica completa e moralmente o concurso a meus olhos.