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quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Aniversário

Como a Kelli informou aqui, dia 29 foi meu aniversário. Estou escrevendo este artiguinho mais como agradecimento às dezenas de mensagens e tuites que recebi e a que não posso responder individualmente. Falta-me criatividade para dar respostas individualizadas a cada uma delas e me repugna dar uma resposta enlatada. Por algum motivo, acho menos antipático postar aqui no blogue, que, de certa maneira, é a maneira como eu falo com todos os meus amigos que sabem ler português ao mesmo tempo. Os que não sabem português nem notaram a data e, portanto, fica por isso mesmo.

Aniversários são marcos artificiais, salvo raras exceções, como o décimo-oitavo, que marca a maioridade, e a diferença entre o Danilo de 27 de dezembro e o de 29 do mesmo mês é quase zero. Mas gente aproveita esses marcos para fazer um balanço e alguns planos.

Dizer que me sinto como se tivesse vinte anos seria deslavada mentira. Minha capacidade de trabalho diminuiu: traduzir cinco mil palavras num dia já é bem mais difícil do que antes, embora ainda não impossível. Estou também muito gordo, resultado de um processo que se iniciou com a doença da Vera e ainda não se encerrou de todo. Ao menos, estou fazendo hidroginástica e voltando às caminhadas. A ver se, assim, me recupero fisicamente.

Não tenho a intenção de virar um daqueles velhinhos lindos e sensuais que a gente vê no cinema, TV e imprensa, porque esses são fabricados a força de maquiagem e Photoshop (para não dizer bisturi e botox) e eu sou de carne e osso e quero continuar assim. Mas também quero captar toda a energia possível, porque tenho a felicidade de, aos 67 anos, estar cheio de planos, expectativas e esperanças. Viver é isso: é ter algo para fazer amanhã. E não me falta o que fazer. Este último ano não foi tão produtivo quanto eu queria — nenhum é — mas a Kelli e eu estamos trabalhando em algumas coisas interessantes e os próximos doze meses devem nos trazer algumas realizações.

Se você me mandou uma mensagem de feliz aniversário, mesmo que atrasada, saiba que fiquei muito feliz com ela. A Internet me deu muitos amigos, alguns muito próximos (mesmo a Kelli é descoberta internética) e esses amigos têm sido uma grande fonte de satisfação e encorajamento. Obrigado a você por ser um deles.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Feliz aniversário, vovô Smurf!

Que que eu posso falar de uma pessoa que me abre tantas portas, que me enche de livros e pfds e dicionários e glossários para consulta, sem exigir nada em troca? Que tem paciência com meus desabafos e me dá conselhos aos montes?

Só posso dizer muito obrigada, desejar um feliz aniversário e que a data se repita muitas vezes. E panquecas dia 16!

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

TPIC no RS - Capítulo 2

Por gentileza do nosso colega Guilheme da Silva Braga, nosso correspondente eventual para o extremo sul e circunjacências, tenho o prazer de informar que uma turminha lá do RS entrou em contato com o Ouvidor da JUCERGS para pedir uma correção do edital do concurso. E não é que corrigiram rapidinho!? Não, desculpe, gaúcho não faz nada rapidinho: lá as coisas saem ligeirinho. O edital corrigido está aqui.

Além de agradecer ao Guilherme pela cortesia de me dar o aviso, é hora de aplaudir a JUCERGS, que fez as coisas civilizadamente. Se todos fossem assim, este seria um mundo melhor.

Pretendemos, Kelli e eu, ir a Porto Alegre em março, para o tal do congresso da ABRATES. Quem sabe, vamos ter a possibilidade de cumprimentar os aprovados.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

TPIC no RS

Deu uma epidemia de concurso para Tradutor Público e Intérprete Comercial. Começou com Minas Gerais, depois veio Santa Catarina, Rio de Janeiro e, agora, Rio Grande do Sul. O edital está aqui, caso interesse.

Isso é muito bom. Deveria haver mais concursos para TPIC. Muitos TPICs ficam zangados quando eu digo isso, argumentando que se houver mais concursos e nomeações, cai o volume de serviço. Não é isso, evidentemente, o que diziam antes de ser nomeados, época em que defendiam, com unhas e dentes, a "abertura da porteira" — o que mostra que o conceito de verdade pode depender em grande parte do lado do muro em que você está.

A afirmação me parece errada, de qualquer modo, porque o objetivo do concurso é atender melhor o público, não garantir serviço para ninguém. Uma colega minha, partiu para a distorção "então, vamos aprovar qualquer um…". Não, eu não disse "aprovar qualquer um": o concurso tem que ser rigoroso, para que o público seja bem atendido. 


De qualquer maneira, o campo está cheio de "quaisquer uns" que trabalham como terceirizados para TPICs, simplesmente porque se sujeitaram a receber o que lhes ofereceram. O problema está na terceirização indiscriminada, não no excesso de TPICs. Aliás, desconfio que exista até quarteirização e qunteirização nessa história — mas isso é só um desconfiar, porque não tenho nem provas nem indícios.

Mas, voltando ao RS, o edital tem uns aspectos interessantes. O primeiro, entre os que eu vi, está em II.A.h, onde se exige:

- licenciatura em letras, com especialização para o idioma para o qual se inscrever ou

- certificado de proficiência e formação em língua estrangeira no idioma para o qual se inscrever

É uma inovação. Nunca vi isso. Nem sei se é legal porque parece que não está nas leis que regem o ofício de TPIC, mas isso é coisa para advogado responder. Tradicionalmente, o exame é aberto e presta quem for cidadão brasileiro, residente no estado e mais umas coisinhas. Nunca se exigiu diploma de nada. Alguns dos melhores TPICs em SP são advogados que nunca fizeram curso de letras e, ao menos uma das melhores TPICs que conheço, jamais fez faculdade de coisa nenhuma.

Mas, tudo bem, exigir um diploma específico até que tem lá sua lógica, numa época como a nossa, de altas especializações. Agora, ainda que mal pergunte, por que licenciatura e não bacharelado? O TPIC não vai ensinar coisa alguma, ou vai? Para que precisa ser licenciado? Além disso, se é para pedir diploma, porque então não restringir a quem tenha especificamente diploma de letras tradutor?

E essa história do certificado de proficiência e formação em língua estrangeira, eu não entendi muito bem. Se você entendeu, por favor, poste um comentário me explicando.

Também fui dar uma olhada na empresa que vai conduzir o concurso: Hilda Ferreira de Moura ME, que aparece numerosas vezes no Google, algumas como localizada em Campo Grande, MS outras como localizada em Surubim PE. Está conduzindo concursos aos quilos por aí. Estranho que uma ME possa encarar tanto concurso junto. Deve estar cobrando uma ninharia e, por isso, ganhando todas as licitações. Será que tem gabarito para enfrentar um concurso para TPIC?

Sempre é bom lembrar que não sou TPIC nem nunca prestei concurso nem em SP nem em outro qualquer estado nem sou terceirizado de qualquer TPIC que se possa imaginar.

(Confesso que detesto essa história de "festas" e estou doido para que chegue janeiro e voltemos à vida normal.)

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Lo de siempre

http://www.tradutorprofissional.com/2006/12/mensagem-de-natal-e-ano-novo.html

(O título original estava errado. Corrigi, depois de lembrado pelo comentário abaixo, mais por cortesia aos hispanófonos do que para "mostrar que sei espanhol", porque não sei mesmo.)

Oficinas de Tradução com Lia Wyler - aprenda com quem sabe

O grande problema da Lia é que ela se tornou famosa por traduzir Harry Potter. Não há nada de errado em traduzir Harry Potter e, particularmente, acho que foi uma tarefa extremamente difícil, desempenhada com brilho. O problema é que a Lia é muito mais que a tradutora de Harry Potter e pouca gente se dá conta disso. Pouca gente tem uma experiência tradutória mais ampla do que ela, que traduziu desde livros sobre esoterismo até material sobre petróleo, passando por literatura de todos os tipos.

Conheço a Lia há muitos anos e estive em uma palestra dela na USP o ano que agora se encerra e me deliciei com o modo simples, direto e divertido como ela trata até os problemas mais cabeludos da tradução. Valeu a pena.

É um pouco de sua vasta experiência que ela vai compartilhar agora, de novo, em suas oficinas de tradução. Para mais informações, dê uma clicadinha aqui, que é o ciberlar dela.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

E você?

Nós dois fizemos nossos depoimentos e parece que muitos gostaram. E agora, por que você não faz o seu depoimento? Como foi que "virou" profissional da tradução? Conte para nós.

E virei tradutora...

Eu costumo medir um pouco o conteúdo, mas adoro falar de mim mesma. Entrei no mundo das Letras por acaso, talvez por destino, se alguém acreditar nisso. A primeira vez em que passou pela minha cabeça ser tradutora foi aos 15 anos, quando traduzia umas músicas. A ideia passou logo, e pensei em jornalismo e arquitetura, entre muitas outras coisas. A arquitetura ganhou. Fui fazer cursinho para prestar a Fuvest e estudar na USP.

No meio daquele ano, 2001, eu estava sem um tostão furado no bolso e a diretora da escola onde eu estudava inglês me chamou para dar aula para as crianças. Deixei de assistir muita aula de gramática no cursinho para dar essas aulas. Depois apareceram outras turmas e fui gostando, gostando, mas não me passava pela cabeça mudar a minha opção de curso universitário. Passava pela cabeça da minha mãe e da minha chefe, no entanto, e logo começou a pressão para eu prestar letras. Fiz a minha inscrição só para me poupar dos discursos. No meio do caminho, comecei a mudar de idéia e ficar indecisa. Prestei os dois vestibulares e estava rezando – naquela época eu ainda rezava – para passar em um só e não ter que decidir. Passei em Letras, fui fazer e me apaixonei. Não duvido que tivesse gostado da mesma maneira de arquitetura, mas duvido que me desse bem como me dei em letras.

Fui levando o curso e dando minhas aulas. Tinha dia de chegar mais de meia noite em casa e ter aula no dia seguinte às sete e meia, e não é nenhum segredo que eu odeio muito acordar cedo. Terminei o curso em 2006 e comecei no Yázigi em 2007, onde fiquei até setembro de 2008. Durante esses sete anos, traduzi uma coisinha aqui e outra ali, em geral artigos acadêmicos. Foi a época em que levei meu único calote, também. Se eu tivesse conhecido o pessoal da comunidade Tradutores/Intérpretes BR antes, não teria levado nenhum. E foi participando da comunidade que a minha vida mudou.

Muita gente acha que Orkut é brincadeira, que só em um bando de adolescente IxCrEvEnDuUu aXxIm. Não é verdade. Na comunidade de tradutores, conheci muita gente, fiz minha rede de contatos, comecei a trabalhar mais seriamente com tradução. Não fosse por aquele espaço, eu nunca teria criado uma postura profissional como a que tenho hoje. E ainda estaria dando aula de inglês e ensinando verbo to be. Foi nessa comunidade que conheci o Danilo, e foi pelas coisas que eu escrevia lá que ele me chamou para trabalharmos juntos. Na mesma época, minha mãe ficou doente e precisei parar com as aulas para poder cuidar dela. Foi um susto para o Danilo, mas tudo acabou dando certo.

A partir daí, as coisas evoluíram muito rapidamente. Foi um salto até eu estar me sustentando e tirando o suficiente para montar a minha casa, em fevereiro. Mas foi um salto para dentro do desconhecido, também. E deu (dá) trabalho, bastante. Pegar o jeito de traduzir, lidar com CATs, com clientes, com prazos, com ter trabalho num dia e no outro não, com lazer, com estudar (pelo menos um pouco) e com família não é fácil e não foi só uma vez em que achei que não ia dar conta de tudo. E não dou mesmo. Não é todo dia que consigo ler alguma coisa, não é todo dia que consigo cozinhar ou cuidar da minha casa ou passear com a minha cachorra ou ir para a academia. De verdade? Teve dias em que nem tempo para dormir eu tive, em 2009. E que, quando finalmente eu tinha tempo para dormir, eram 7 da manhã e o vizinho estava fazendo barulho com a furadeira. Para “equilibrar”, também não foi em todo momento que eu tive serviço (e, consequentemente, dinheiro). Além disso, estou investindo grande parte do que recebo – ia dizer do que sobra, mas se tem uma coisa que nunca sobra é dinheiro – em equipamentos, softwares, livros e dicionários.

Mas tudo isso está longe de ser uma reclamação. A verdade é que, enquanto eu ainda era professora, eu não conseguia me imaginar daqui a 20 anos, por exemplo. Não me passava pela cabeça de que eu poderia viver no futuro, só sabia que não seria de dar aula. Hoje eu consigo me ver velhinha e traduzindo alguma coisa completamente escandalosa, deliciada com o choque que as pessoas sentem com uma velhinha boca suja.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Por que sou tradutor?


Outro dia, a Kelli e eu estávamos discutindo uma série de mensagens em diversos fóruns cujos autores pareciam ansiosos por fazer qualquer outra coisa que não fosse traduzir. Então, resolvemos escrever dois artigos, um ela e o outro eu, falando um pouco da relação entre nós e a profissão de traduzir. O primeiro, o meu, vai aqui. Espero que gostem e comentem. O da Kelli já está escrito e aparece amanhã.

Não gosto de falar de mim próprio. Tive uma vida difícil e complicada, cheia de episódios amargos, muitos dos quais prefiro esquecer e outros tantos de que prefiro não lembrar. Mas hoje, vou abrir uma exceção.

Em meados de 1970, estava na miséria. Um conjunto muito complexo de fatores me tinha levado a montar uma franquia Fisk em Porto Alegre, empreendimento para o qual eu não estava preparado nem financeira nem profissionalmente. Na Fisk São Paulo (onde trabalhei depois de trabalhar no Yázigi), tinha feito uma carreira meteórica, passando em menos de um ano de professor dos iniciantes a algo que, talvez, hoje, chamássemos coordenador pedagógico ou o que seja. Como ia casar e estava, por motivos particulares, ansioso por sair de São Paulo, cismei de abrir a franquia em Porto Alegre.

Foi um fracasso medonho. Nada de errado com Porto Alegre nem com a Fisk: o problema era que sou um péssimo administrador e a Vera não era muito melhor. Passamos fome, até. Voltei, arrasado física, financeira e moralmente, em julho de 1970, para morar de favor na casa do sogro, a última das humilhações. Verdade se diga que meu sogro me recebeu com uma generosidade de que até hoje me lembro com gratidão, mas o que eu queria era morar com a minha mulher no meu canto, não na casa dele.

Voltei a ensinar, na própria FISK. Dei um duro danado. Ainda hoje sou meio elétrico, imagine o que eu era com menos de trinta anos de idade. Lá para novembro de 1970, a Fisk me ofereceu "fazer umas traduções" na Arthur Andersen, que, na época, era uma respeitadíssima firma de auditoria. Vinte horas por semana, sem janela, com 50% de bonificação porque eram "aulas externas". Um dinheirão, como pode confirmar qualquer um que pene ensinando inglês em cursos livres.

Não sabia o que era auditoria. Mal sabia o que era contabilidade. Tinha feito uma que outra tradução, mas a experiência era mínima, embora em minha Carteira Profissional conste um registro como tradutor datado de 9 de janeiro de 1963.

Aprendi pelo velho método de cair na piscina e ficar me esbatendo como um doido, até descobrir como se faz para nadar. Mas estava me divertindo aos montes. Era (e é) uma festa ser tradutor e, a cada dia que passava, eu me divertia mais.

Depois de uns dias, passou o chefão da firma na minha sala e me perguntou se eu aceitaria um emprego lá. Pedi demissão da Fisk, nunca mais dei aula de inglês na vida. Tinha sido mordido pelo bichinho da tradução: não tinha volta.

Dia 1º de dezembro de 1970, fui admitido como empregado. Como o emprego era de meio período, fui procurar uma editora, para trabalhar o resto do dia. Usando meu emprego como trampolim, comecei a traduzir para a Editora Atlas. Detestei a Arthur Andersen. Por mil motivos, não me ajustei à firma e, em 17 de dezembro do ano seguinte, saí, por vontade própria. Nunca mais tive um emprego na vida.

Desde aquele tempo, jamais houve um dia em que eu quisesse mudar de profissão. Tive bons e maus momentos, tive um momento de dar curso de Word para um cliente; duas vezes, imbecilmente, me prendi demais a um cliente só e me danei quando ele arranjou outro tradutor; tive outros problemas, como um contrato sem cláusula de correção monetária em tempos de alta inflação. Mas nunca pensei em abandonar a profissão.

Lutei muito, estudei muito, investi muito: o que eu tenho e o que eu sei, pouco ou muito, ganhei na base do sangue, suor e lágrimas. Mas este é o meu lugar. Agora, beirando os 67 anos e já recebendo aposentadoria, acho que fiz bem. Sou feliz como tradutor.

Tenho pena, muita pena, dos que traduzem porque não têm alternativa; dos que estão rezando para aparecer alguma coisa por aí que os libere do traduzir; dos que vivem das lembranças de um passado dourado, em que tinham outra profissão, que consideravam mais nobre, e que não perdem uma oportunidade para lembrar; dos que não investem na profissão, porque não têm fé nem nela nem muito menos em si próprios.
Deve ser muito ruim viver desse jeito.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Edição Extra - Ministério da Justiça quer Multar SINTRA

Gente, embolou o meio de campo! Segundo notícia publicada no G1, o Ministério da Justiça quer multar o SNTRA por causa da tal tabela de preços. A multa seria algo entre  R$ 6 mil a R$ 6 milhões. Espero que não multem. O pobre do SINTRA nem pode pensar em pagar uma multa dessas.





segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Carta aberta ao SINTRA

À colega
Elizabeth Lélia Thompson
Presidente do SINTRA — Sindicato Nacional dos Tradutores

Prezada colega,

Repassaram-me ontem a mensagem eletrônica reproduzida ao final deste texto, que pretensamente é de sua autoria. Se não for, por favor, me desculpe, mas tem toda a aparência de ser. Achei que o assunto é tão relevante que merecia uma "carta aberta", que vai aqui.

As informações contidas na página de Valores Praticados do SINTRA, na sua forma, talvez violem alguma disposição de algum diploma legal, mas é impossivel acreditar que, no seu conteúdo, configurem formação de cartel e espero que as autoridades percebam o fato. A última coisa de que necessitamos agora é uma encrenca com a lei.

Não creio que formação de cartel seja delito que se anuncie aos quatro ventos, como o SINTRA faz há anos com os valores praticados. Só a publicidade dada aos Preços Praticados, a meu ver, já faz muito por descaracterizar o delito. Cartel é coisa que se organiza ao pé do ouvido e por meias palavras, preferivelmente sem sombra de documentação.

Cartel também é coisa de pequenos grupos com forte organização: carteis, oligopólios e oligopsônios são lobos da mesma alcateia. Mas somos milhares de tradutores, muitos simples biqueiros, que fazem da tradução uma fonte de renda subsidiária; outros tantos são "tradutores transitórios", gente que "pega" uma tradução, mas depois "arranja um emprego" e nunca mais volta a traduzir nada; — fora os que traduzem "por amor" e aceitam ganhar nada ou quase nada, porque têm outra fonte de renda que lhes garante o sustento, estes, normalmente, gente do mundo acadêmico.

Além disso, como há muito mais gente querendo traduzir (ou achando que quer) do que serviço de tradução disponível, o mercado é dominado pelos compradores e todo tradutor que esteja no mercado há mais que uns poucos meses já ouviu o famoso "não falta quem faça por bem menos que isso". Fazer cartel em mercado dominado pelos compradores é impossível por definição.

Os tais Preços Praticados são, na verdade, mais um ideal, aquilo que gostaríamos de receber, do que uma realidade. Poucos conseguem chegar lá. Eu consigo sem grandes esforços, mas tenho 40 anos de tarimba e sou um especialista numa área que sabidamente paga bem.

Temos ainda de lembrar que muito — caso não a maior parte — do serviço que roda por aí é intermediado por agências e muitas das agências brasileiras ou cobram de seus clientes os Preços Praticados do SINTRA ou até oferecem algum desconto como incentivo. Sabe, aquela história do "estou te cobrando 10% menos que a Tabela do Sindicato". Como repassam o serviço ao tradutor final, necessariamente ficam com uma parte do pagamento como ressarcimento de suas despesas e lucro e, por menos que retivessem, não poderiam jamais pagar ao tradutor propriamente dito o tal do Preço Praticado.

Outras agências vivem de repasses de agências estrangeiras, por exemplo, de agências dos EUA que tomam enormes serviços a serem traduzidos para várias línguas e retalham o trabalho entre várias agências de outros países, inclusive Brasil. Atualmente, com o real nas alturas, os preços praticados no exterior são inferiores aos praticados aqui. Nem que quisessem, essas agências poderiam praticar os preços preconizados pelo SINTRA.

O caso das editoras, que representam uma parte muito visível porém menor do nosso mercado é interessante: embora algumas editoras de elite estejam se aproximando lentamente dos Preços Praticados (Haleluia!), a maioria está bem longe deles.

Realmente, ver cartel aí, exige um grande esforço de imaginação.

Não sei se ajudei alguma coisa ou se piorei a situação.

Danilo Nogueira

A mensagem pretensamente do SINTRA é esta:
Caros colegas,
O Sintra está sendo investigado por possível formação de cartel, pela divulgação da nossa lista de valores de referência.
A Secretaria de Defesa Economica abriu um processo administrativo acusando-nos disto. Estamos na fase do final da instrutoria do processo e na segunda feira mandaremos as alegações finais (de defesa), para corroborar ainda mais que o Sindicato publica sim uma lista de preços, mas que esta lista de preços não é impositiva nem para os filiados nem para as empresas que contratam tradutores, solicito a ajuda de todos vcs que nos mandem emails dizendo que vocês usam a lista apenas como base mas que a palavra final, o acordo, é feito entre vcs e a empresa que contrata o serviço.
Queremos anexar os e-mails como prova que o Sindicato não impõe os preços apenas os sugere.
Obrigada a todos pela ajuda
Elizabeth

sábado, 12 de dezembro de 2009

Você decide – traduzir ou não traduzir? final

Um pedido de desculpas: o blogue andou meio abandonado, esta semana, por motivos que qualquer tradutor pode adivinhar. Agora, ao trabalho!

Hoje vou encerrar o "Você Decide: o Repasse", para depois ir aos outros pendentes.

Em resumo, para mim, do ponto de vista ético, tudo gira em torno do que a repassante disse ao cliente final. Se disse que ia fazer o serviço, se apesentou seu CV e sua experiência, mas repassou o serviço, estava errada. Se deixou claro que não ia fazer mas ia procurar quem fizesse, não vejo nada de errado, embora eu próprio jamais repasse inglês e só de raro em raro repasso algo em alguma outra língua.

A porcentagem que a repassante reteve também não me preocupa em nada. Aliás, prefiro não saber. Eu quero saber quanto é que eu vou receber. Por exemplo, R$ 0,05 por palavra é pouco para mim, quer o repassante esteja retendo muito, pouco ou nada. E R$ 0,50 por palavra é bastante (agora, dezembro de 2009), também sem entrar no cômputo o que quer que o repassante tenha retido: simplesmente não vem ao caso.

O José Henrique Lammensdorf nos lembra que, em muitas situações existe o repasse do repasse do repasse e analisa as consequências. É verdade. Cada um que repassa, fica com uma fatia do pagamento e quando chega na mão do tradutor no "terceiro subsolo", o que sobra é muito pouco. Mas essa observação mais complementa do que invalida o que eu disse acima.

A tradutora Alfa, que estava no fim da linha fez bem em devolver o trabalho depois de aceito? A bem dizer, nem entendi direito se ela recusou porque ia receber só um terço do valor total ou se era por ser um repasse. Em ambos os casos, não me parece que tenha havido razão para recusa, salvo se tivesse chegado ao conhecimento dela que a repassante tinha se comprometido a fazer o serviço pessoalmente. Nesse caso, sim, existe a cumplicidade com uma mentira e isso não é bom. Mas, ao que eu tenha entendido, a posição da repassante jamais ficou clara.

De resto, se o pagamento era pouco, era pouco com ou sem repasse.

Acho que agora, podemos dar o assunto por encerrado. Amanhã, tem mais.

E muito obrigado a todos os que comentaram. Blogue sem comentário não tem graça.

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

O que é traduzir?

Estou com pouquíssimo tempo para escrever aqui hoje, mas não quero perder a chance de divulgar um brilhante comentário do nosso colega Renato Motta: traduzir é pisar em ovos.


Ia comentar, mas é supérfluo.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Edição Extra: nota de falecimento — Yvan Cloutier

Perdemos Yvan Cloutier.Vai fazer falta. Há tempos ele pediu que alguém o ajudasse na tarefa de conduzir a lista Eurêka, um tesouro de informações sobre terminologia. Agora, visto na perspectiva que só a distância confere, me parece que ele sabia que estava doente e que tinha pouco tempo de vida. Morreu de infarto, o que significa que deve ter sofrido pouco. Menos mal.

Trabalhava no Gabinete de Terminologia do governo de Québec, que faz parte de um pequeno grupo de líderes na área. Não posso dizer que tivéssemos sido amigos: escrevi um par de vezes na lista dele e ele sempre respondeu, atencioso, mas foi só. Era somente mais um de seus admiradores, embora soubesse muito pouco sobre ele. O que esse homem achava na Internet não era normal e os arquivos da lista Eurêka ainda por um bom tempo vão servir de orientação para nós. Vai o homem, fica sua obra.

Começou mal, a semana.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Se você pensa que é só tradutor brasileiro que sofre

Veja este filminho sobre o pessoal que faz legendagem para surdos e deficientes visuais na França e suas dificuldades.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

ABC de memórias de tradução

Traduzir, hoje, é muito mais fácil que no passado, não só pela inesgotável fonte de informações e contatos que é a Internet, mas também por causa das CAT tools. E o que faz esse trem de nome esquisito?

Computer-aided translation tools, ou seja, ferramentas que auxiliam a tradução no computador, são frequentemente confundidas com tradutores automáticos. Um erro comum, mas as duas coisas não poderiam ser mais diferentes. Um tradutor automático traduz para você, sozinho. Pode não ficar uma maravilha – e não fica mesmo, pelo menos por enquanto – mas ele traduz. Uma CAT tool não faz nada sozinha, nada. Para o tradutor iniciante, muitas vezes ela chega até a atrapalhar, mas compensa como investimento futuro. Como não se passa uma semana sem que o Danilo e eu recebamos perguntas sobre as tais memórias de tradução, tive a ideia de desenvolver um ABC, que vai ainda aumentar muito e que vai ser parte de uma surpresa que estamos preparando.

Uma das principais atrações dessas ferramentas é a TM (translation memory). TM é o arquivo onde a ferramenta armazena todas as suas traduções, segmento por segmento, junto com o original. Segmento é um trecho pequeno do texto, em geral uma frase. Em novas traduções, a CAT tool consulta esse arquivo e, se a frase a ser traduzida estiver lá, ou for parecida com a que está lá, maravilha: ela sugere a tradução, você revisa e complementa se for necessário, e não precisa traduzir de novo. Com isso, dá para perceber que uma TM bem recheada, principalmente para quem trabalha com textos repetitivos, é uma ajuda imensa e aumenta muito a produtividade. Mas, quando a gente começa a usar uma dessas ferramentas, a TM está vazia e não ajuda em nada.

Outro grande trunfo é o glossário. Aqui, também, os iniciantes estão em desvantagem, porque precisam começar seus glossários do zero, e isso toma um tempo enorme (eu, pelo menos, acho que sim). Mas existem duas vantagens que, a meu ver, compensam o esforço: não precisar digitar várias vezes a mesma sequência repetida, nem palavras comuns na língua, e não precisar refazer uma pesquisa complicada sobre determinado termo que rendeu aquela solução fantástica e que, depois, você corre o risco de não lembrar.

Existem vários softwares de auxílio à tradução, para todos os gostos e bolsos – tem inclusive alguns grátis. O mais conhecido e pedido é o Trados, que eu nunca vi na frente. Creio que, hoje, o grande concorrente é o MemoQ, que eu uso e é uma gracinha. Faz coisas incríveis, mas é caro, custando cerca de 2 mil reais, conforme o câmbio. Comprei o meu em uma promoção de 50% de desconto. Dos pagos, o mais acessível é realmente o Wordfast, que ainda tem desconto para o Brasil (e outros países). Ainda que caros, eu acredito que compensa. Além de aumentarem a produtividade, e consequentemente o lucro, ainda me permitem fazer coisas que, sem eles, eu não poderia fazer, e perderia o dinheiro, quando não o cliente.

Alguns desses programas, como o Wordfast, podem trabalhar em conjunto com o Google Translate. Ajuda em algumas ocasiões, atrapalha em outras, quando revisar a sugestão do Google dá mais trabalho que traduzir sozinho. Mas acredito que dê pra perceber que isso é só mais um detalhe, não a principal função desses nossos amiguinhos.

Aprender a usar as ferramentas de tradução não é tarefa óbvia. Tem gente que tem mais facilidade, e vai sozinho, com o manual, numa boa. Eu lembro que, da primeira vez que vi o Wordfast na minha frente, eu lia, relia e trelia o manual e não entendia nada do que aquilo tudo queria dizer. No meu caso, perguntar aqui e ali resolveu. A apostila aí do lado (que na época era só do Danilo) também me ajudou demais da conta. Mas tem gente que precisa de cursos. Tem alguns tradutores que ainda dão curso de Wordfast. O pessoal da Kilgray, desenvolvedores do MemoQ, faz vários Webinars – apresentações de uma hora – por mês, mas em inglês, alemão e talvez alguma outra língua que eu não lembro agora. Já assisti o básico umas duas ou três vezes e sempre aprendo algo novo.

De tudo isso, só concluo uma coisa: só não se atualiza quem não quer.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Edição Extra Extra: Martin Claret X Denise Bottmann


Do blogue da Denise Bottmann:

No dia 03/11 o Juiz de Direito da comarca de Registro rejeitou a queixa-crime proposta por Martin Claret, em sentença publicada no Diário Oficial do Estado, por considerá-la sem justa causa. Decorrido o prazo para recurso sem manifestação do proponente. 



Se você não entendeu direito, a Martin Claret ingressou em juízo contra a Denise. Houve uma audiência de conciliação,  em que a Denise se negou a retratar-se. Posteriormente, o juiz rejeitou a queixa, quer dizer, concluiu que a Denise não tinha cometido crime algum. Dessa rejeição, cabia à Martin Claret o direito de apelar e, para isso, tinham um prazo. Optaram por não apelar, que também é direito deles. Como não apelaram no prazo, não podem apelar mais.


Nossos parabéns à Denise e ao seu advogado. Por outro lado, do fundo do coração, esperamos que a Martin Claret e as outras editoras envolvidas no escândalo dos plágios de tradução passem a agir direito.


Denise, um abraço e tome uma boa garrafa de vinho tinto hoje. Você merece.


O blogue da Denise está aqui. Clique para visitar e deixar um recadinho a ela. Ela merece.



















Edição extra: O Renato, a Época e o tradutor

Nosso colega Renato Motta notou que a revista Época tinha deixado de publicar o nome de quem traduziu um determinado livro. Achou injusto - como achamos todos nós - e achou que algo precisava ser feito. Tendo chegado a essa conclusão, decidiu que caberia a ele agir. Quer dizer, não caiu naquela esparrela de começar a esbravejar que "alguém tem que fazer alguma coisa".

Pensou lá com seus botões e concluiu que a melhor coisa a fazer era escrever à revista. Outros teriam começado uma campanha absolutamente inócua do tipo "Não compre a Época: ela não dá valor ao tradutor". O Renato achou que a primeira coisa a fazer era escreve uma mensagem — e escreveu o que você pode ler aqui abaixo.
Na edição de 30 de novembro de 2009, a revista Época apresentou uma interessante reportagem sobre o livro Nossa Escolha, escrito pelo ex-presidente norte-americano Al Gore. A matéria é um trecho muito bem traduzido de um livro que será lançado em dezembro, mas o editor se esqueceu de informar o nome da pessoa que fez a tradução da obra.
Curiosamente, o fotógrafo cuja imagem ilustra o artigo, Jeff Riedel, foi devidamente creditado. O editor da matéria sabe que uma foto não surge do nada. Uma foto sempre tem um profissional por trás dela; um profissional que enquadrou o objeto de interesse da lente, ajustou o foco, preparou a iluminação e editou o material antes de ele ser publicado.
Infelizmente, esse mesmo editor não percebeu que a tradução de um texto também não surge do nada. Toda tradução sempre tem um profissional dedicado por trás dela; um profissional que fez a transcrição das palavras originais - do inglês ou de outra língua - para a nossa; um profissional que re-escreveu o texto em nosso lindo idioma para que ele pudesse ser saboreado pelos leitores da revista Época, e também ajustou as frases, preparou a iluminação, revisou tudo e editou o material antes de ele ser publicado.
Peço à direção da revista Época que alerte os seus editores para o fato de que as traduções devem SEMPRE ser creditadas, pois é isso que merece o profissional que a realizou, o mesmo merece o leitor da publicação e assim determinam as leis éticas da nossa sociedade.
Obrigado.
Renato Motta
É uma mensagem educada, nada daquela oratória altíssona, grandíloqua e sesquipedal, carregada de ironias e generalizações acusatórias, do tipo "a autoproclamada grande imprensa que se diz democrática…", nada de insultos. Aponta uma falha, demonstra que é uma falha pela comparação com o caso do fotógrafo, creditado pelo seu trabalho, e pede uma correção, sem criar confrontações.

Achando bom pedir um pouco de pressão por parte dos colegas, postou a mensagem aqui , onde deve ter sido lida por várias centenas de colegas, vários  dos quais escreveram à revista. No fim da tarde, a Época já estava se desculpando e dizendo que vai publicar uma errata.

Vitória para nossa categoria? Por certo! De parabéns o Renato pela ação e a revista Época pela reação. Mas é bom lembrar que foi também uma vitória da civilização. Porque o Renato, antes de agir como tradutor, agiu como homem civilizado e a Época, ao reconhecer o erro, retratar-se e prometer solução, também agiu civilizadamente.

Agora, olho vivo para ver se não recaem em tentação - e fica o exemplo. Se você for membro da comunidade do Orkut, deixe lá o seu abraço ao Renato. Se não for, deixe um abraço no perfil dele - ele de certo merece nossa gratidão.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O exemplo vem de onde?

Minha amiga Ana Luiza Iaria irritada por ter visto "facilidades de recreação" no prospecto de um hotel, redigido originalmente em português. Mas, pense bem, se nas listas dos tradutores um diz que pegou "um job" e o outro diz que fez um "freela", quem somos nós para reclamar, ainda que mal pergunte?

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Você decide – traduzir ou não traduzir?

Apareceu na imprensa uma história de que, em uma reunião de que participava um estrangeiro, o Presidente Lula contou que tentara estuprar um companheiro de cela. Quem narrou a história participou da discussão e, entre outras coisas, funcionou como intérprete ad hoc, mas se negou a traduzir a história da tentativa de estupro.

Outras pessoas que estavam na reunião confirmaram a história, mas disseram que não levaram a sério a afirmação, porque, para qualquer pessoa que conhecesse Lula, era óbvio que era mais uma das histórias malucas que ele costumava inventar para divertir a plateia e irritar um que outro e que ninguém acreditou que tivesse havido uma tentativa de estupro.

Se Lula tentou ou não estuprar alguém, é coisa que não interessa a este blogue. Este é um ciberponto de encontro para a discussão sobre questões de tradução e o que nos interessa aqui é o que deve fazer o intérprete/tradutor numa situação dessas. Então, reformulemos a história de modo mais seco, para podermos conversar, como profissionais da tradução. Imagine as situações abaixo:
1. Você é intérprete em uma reunião, da qual participa uma pessoa de projeção (político, artista, membro da comunidade de negócios, intelectual…). Essa pessoa de projeção, em dado momento, faz uma declaração que, se divulgada pela imprensa, pode causar grandes constrangimentos e prejuízos (tentei estuprar, estuprei, roubei, matei, destruí, prejudiquei…). O que você faz?
(a) Traduzo exatamente o que foi dito. O orador é responsável pelo que diz. Tradutor não é censor. Se eu não traduzir o que ele disse, estarei atraiçoando a audiência. Deixo à audiência decidir se a história é verdadeira ou mera brincadeira.
(b) Omito ou abrando as declarações, porque é minha responsabilidade evitar um incidente desnecessário.
(c) Depende de quem está me pagando. Se for o orador, omito ou abrando, porque minha função é evitar problemas para ele. Se for a audiência, faço uma tradução tão fiel quanto puder, porque, ao aceitar o serviço, aceitei a incumbência de manter a audiência bem informada.
(d) Se for um político do meu partido, omito ou abrando; se for um político de outro partido, deixo que ele se arrebente.
2. Se estivesse na audiência:
(a) Preferiria que o intérprete traduzisse tudo o que foi dito. Cabe a mim decidir se foi brincadeira ou se foi a sério.
(b) Preferiria que o intérprete traduzisse tudo o que foi dito, mas explicasse que evidentemente se tratava de uma brincadeira, se fosse o caso.
(c) Omitisse as observações mais cruas, para evitar um escândalo e salvaguardar a honra do orador.
(3) Se fosse o orador:
(a) Preferiria que o intérprete traduzisse tudo. Eu assumo responsabilidade pelo que digo.
(b) Ficaria grato se o intérprete omitisse ou abrandasse qualquer coisa que me pudesse causar problemas posteriores.
As três perguntas acima e as respostas sugeridas são meros guias para os seus comentários. Mas esqueça, ou ao menos faça por esquecer, que estamos nos referindo a uma determinada pessoa, da qual você pode gostar muito ou detestar. Faça de conta que é um exercício puramente acadêmico sobre um personagem fictício.

Comente à vontade, mas lembre que os comentários a este blogue estão sujeitos a aprovação. Não serão aprovados comentários que contenham mensagens políticas implícitas ou explícitas. Há mil lugares onde se pode discutir política; aqui, falamos sobre tradução.


Na semana que vem, comentamos.




Esclarecimento postado no dia 1/12: Agradecemos aos diversos comentaristas, que, inclusive, tiveram o bom senso de se ater ao assunto, sem se desviar para o lado político da questão.


Segundo tudo o que lemos sobre o assunto, não há dúvida de que o Lula contou a história e que a história era a descrição de uma tentativa de estupro, inclusive com uma descrição da reação da quase-vítima. O interessante é que parte das pessoas viu como uma brincadeira (de bom ou mau gosto) e outra parte viu como a descrição de um fato real. Por outro lado, as expansões do tema feitas por alguns dos comentaristas só enriquecem a discussão. Obrigado por agora e continuem comentando.


Os comentários já postados mostram que as respostas podem ser diferentes conforme se trate de simultânea ou consecutiva — e, mais ainda, se for tradução escrita, para legendagem ou dublagem. Se alguém quiser explorar essas facetas, considero uma contribuição positiva.
















domingo, 29 de novembro de 2009

Você decide: O Repasse

Vários dos comentaristas demonstraram revolta com o fato de que Beta estava retendo 2/3 do preço pago pelo cliente Gama e que Alfa, que "estava fazendo o serviço", ia ficar somente com 1/2.
Essa questão sempre aparece e, na minha opinião, é sempre irrelevante. Mas antes de dar a minha opinião, quero contar um caso real. Colega me escreve dizendo que de vez em quando tinha excessos de serviço e gostaria de repartir (gente fina não repassa: quem repassa é agência; gente fina "reparte" ou "divide"]. Perguntou se eu achava aceitável uma divisão a 2:1, quer dizer, o tradutor encarregado ficava com 2/3 e ela com 1/3. Nunca descobri se ela estava me oferecendo serviço de um modo indireto, mas essa não é a questão. A questão, para mim, é "2/3 de quanto?" Se ela me dissesse "2/3 de R$ 0,09 por palavra", a resposta era negativa, porque isso significaria R$ 0,06 por palavra no meu bolso, o que é menos que o meu mínimo. Se fossem 2/3 de R$ 0,90 por palavra, aceitaria com prazer, porque daria R$0,60 por palavra, o que é mais do que estou conseguindo cobrar. Quer dizer, não quero saber quanto a intermediária retém, eu quero saber quanto me paga.
Essa minha postura tem um outro lado: não dou o famoso "desconto de mau negócio". Não me venha com a história do "estou cobrando pouco do cliente". Se alguém pegou um serviço a dois reau a baciada isso é problema dele, ele que se dane e não venha descarregar o prejuízo nas minhas costas.  Quer dizer, a intermediária tem lá seus problemas e eu tenho os meus. Eu não pago as contas dela, ela não paga as minhas. Mas disso, falo no próximo capítulo desta novela.
Terça-feira volto à esta discussão. Amanhã, temos outro "Você decide", mais uma vez com uma semana para comentários. Enquanto vocês postam comentários, eu volto a este assunto. Parece que os "você decide" vieram para ficar. É muito divertido.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Você decide – O Repasse


Semana complicada, discussão interrompida. Aqui, terminei dizendo que tradutor detesta recusar serviço. Muitos tradutores sofrem de insegurança crônica. Acham que, se recusarem um serviço ou se recomendarem um colega, vão perder o cliente. Então, pegam tudo o que oferecerem, mesmo que não possam fazer. Não podendo fazer, repassam.

Mas o repasse é muito mal visto e, portanto, quem repassa, muitas vezes faz cabriolas intelectuais para se justificar. Está "ajudando um cliente", é "para não cair na mão de agência", essas coisas. O fato é que se o tradutor disser, "não posso fazer, fala com fulano", ou "vou pedir que um colega meu entre em contato com vocês" resolve o problema da mesma forma — mas é raro o tradutor que tem peito para fazer isso: o medo de perder o cliente — quando não o desejo de fazer uns trocados — impede.
Aqui chegamos, agora, a uma questão fundamental: é ético repassar serviço? Beta estava certa ao pegar o serviço e oferecer a Alfa?

O combinado está sempre certo. Filosofia de boteco, sem dúvida. Se você quer em termos mais bonitos, diga assim "Vale a convenção entre as partes", que é como os advogados dizem. Se Beta se apresentou ao cliente final como uma agência, nada vejo de errado no repasse. Porém, se, para pegar o serviço, ela se apresentou como a tradutora que ia se encarregar do trabalho, mostrando seu CV e sua experiência profissionais como meios de conseguir a encomenda, é errado repassar a outra pessoa, por competente que essa pessoa seja. Transparência, honestidade, são características essenciais de qualquer negócio.

Está certo pagar ao tradutor só um terço do que vai receber do cliente? É esta a pergunta que vou responder durante o fim de semana. Espero que você goste da resposta.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Edição Extra: Desaforo!

Gente, é demais. Aconteceu de novo. Todo santo dia acontece, não tem exceção. Não falha um!

"Estudo inglês a 10 anos" 

Ótimo, mas, não teve dez minutos, nesses dez anos, para aprender a escrever português? Para aprender que é "há dez anos"? E quer se dedicar à tradução! De vez em quando, me ferve o molho de tomate que me corre nas veias e dá vontade de responder como se respondia no Brás, na minha infância. Mas não adianta. Primeiro que a destinatária da correção ainda responde com mimimi, 'tadinha. Segundo, que vem a turminha do "ah, temos que fazer críticas positivas" passar a mão na cabecinha de bagre. Farei, então uma crítica altamente positiva: quer ser tradutor? Ótimo. Gaste cada minuto livre de sua vida estudando a sua segunda língua (provavelmente o inglês) e para cada minuto que estudar a segunda língua, estude ao menos dois de português. Agora, escreva 100 vezes:

Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
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Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
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Estudo inglês há dez anos.
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Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
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Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
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Estudo inglês há dez anos.
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Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.
Estudo inglês há dez anos.

O enlace para este artigo é http://www.tradutorprofissional.com/2009/11/edicao-extra-desaforo.html. Quando aparecer pela sua frente um "a 10 anos", ou, pior "a 09 anos", responda com o link.

Embolou o Meio de Campo - para Lucya Hellena e Luciana

Estou respondendo aqui às mensagens destas duas colegas, porque parece que têm a mesma origem (terão elas feito o mesmo curso? Serão conhecidas uma da outra?) e porque creio que haverá mais gente neste bonde.

Estamos (este artigo está passando pelo crivo da Kelli, que já me fez re-escrever tudo duas vezes e disse que ainda não está do jeito dela, mas que dá para postar) surpresos com a reação de vocês duas. Parece que vocês entendem essa tradução via Google Translate como a pedra de toque do Wordfast Classic, a sua característica mais importante. Não concordamos. Sabemos usar a tradução automática e até usamos em um que outro caso. Mas sua utilidade é restrita e, em muitos casos, o uso é desaconselhável, porque dá mais trabalho revisar o Google do que fazer tudo do zero, com o material da memória e glossários.

Wordfast Classic é uma poderosíssima ferramenta para o tradutor profissional. Seus principais recursos são o uso avançado de glossários, as cabriolas que ele pode fazer com os comandos da Pandora's Box, o sistema eficientíssimo de pesquisa de frases na memória, os sistemas avançados de controle de qualidade, enfim, uma série enorme de recursos que mesmo programas mais caros não oferecem. Mais refinado que o Wordfast Classic, atualmente, só o MemoQ — que não tem essa coisa de tradução automática via Google. Aliás, o Trados antigo tinha, não deu muito certo. O Trados novo, apesar de algumas informações divulgadas por aí, ainda está muito cru. Sugiro ficar longe.

Perante tudo o que foi dito acima, a tradução automática, via Google Translate, signfica pouquíssimo.
Para usar o Google Translate, o Wordfast Classic usava uma "porta" que o Google tinha deixado aberta. A porta foi fechada pelo Google (direito deles) e agora o Wordfast Classic não pode mais entrar. Não há absolutamente nada que o atendimento do Wordfast Classic possa fazer. A porta foi fechada "por dentro" e não adianta bater, porque só o Google tem a chave e vai abrir quando quiser. Encerraram o serviço, nada podemos fazer. A equipe do Wordfast Classic está procurando uma outra porta. Ela existe, está sendo testada, mas ainda não foi a nova versão que usa essa porta não foi liberada porque não se tem certeza de que vá funcionar direito. Terminados os testes, se for aprovada, será liberada. Eu aviso aqui, vocês atualizam o Wordfast Classic (grátis, durante três anos) e ficam felizes.

Não achamos o Wordfast caro. Tirante o OmegaT e mais um que outro programa grátis, todos eles muito limitados, o Wordfast Classic é o programa de tradução assistida por computador mais barato que existe e ajuda tanto que a gente costuma recuperar o preço em menos de uma semana de trabalho. Se vocês querem ser profissionais de sucesso, preparem-se para investir e investir alto. Eu devo muito do que consegui aos meus altos investimentos em equipamento e programas e a Kelli está seguindo meu caminho e se tornando uma profissional supre equipada. Sem investimento, não há lucro. Nós não investiríamos dinheiro na compra do Systran. Não achamos que valha a pena. Mais vale a pena procurar aprender a usar melhor os recursos do Wordfast, mediante cursos ou com o manual.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Você decide: O Repasse

Como prometido, vou comentar os comentários sobre a história contada aqui. Vai precisar de mais de um artigo, porque os 28 comentários recebidos — e os mais que ainda espero receber — vão dar muito pano para mangas e quero fazer uma análise bem detalhada.

Entre uma ínfima minoria de tradutores que jamais repassou um serviço e um outro grupo que repassa todos os serviços que pega, fica a maioria, a grande maioria, que repassa parte dos serviços que aceita.

Detesto repassar serviço. Outro dia, um cliente americano me mandou um pacote de serviço do inglês e dois arquivos em francês. Deve ter havido algum mal-entendido, porque ele cria que eu traduzisse do francês, o que não é verdade. Avisei, e ele disse "Onde é que eu vou arranjar agora quem faça francês para o português? Te vira aí, você, por favor." Note que esse cliente está na Califórnia e não fala português. Para ele, arranjar alguém confiável que fizesse duas mil palavras do francês para o português de um dia para o outro ia ser terrível. Ia ter que postar no ProZ ou coisa pior ainda — e era material confidencial. Para mim, custou um telefonema a uma amiga de um quarto de século. Mas mandei para um os dados do outro, para que, no futuro, se entendessem sem a minha interferência.

Mas muita gente repassa e repassa bastante. Repasses sempre ocorreram na tradução e Paulo Rónai nos conta uma história divertidíssima de um escritor húngaro que vivia de vender a editoras traduções de terceiros que eram publicadas com o "peso" da sua assinatura. Quer dizer, não é coisa nem de hoje, nem do Brasil.

O repasse de trabalhos é muito mal visto entre os tradutores, tratado como se fosse um roubo. Por outro lado, tradutor detesta recusar serviço. Conciliar essas duas posições antitéticas não é fácil, mas é algo de que vou falar amanhã, quarta-feira, porque por hoje é só.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

E a transparência?

Logo que o Danilo lançou a enquete, eu fiquei com vontade de comentar, mas resolvi esperar e ler o que as outras pessoas tinham a dizer antes. Foi uma boa decisão. Mas uma coisa estava me martelando e continua, porque não vi ninguém tocar no assunto. Tradutor A pegou um serviço da empresa B e repassou para o tradutor C, era isso, não?

A mim, pouco importa o preço do repasse. Creio que cada um aceita aquilo que acha que merece ou consegue e, uma vez aceitos o serviço e o valor, essa é uma reclamação estéril e até, conforme o caso, antiética. Acho a questão da transparência com a empresa que solicitou o serviço muito mais importante.

Se ela foi avisada e concordou, não vejo problemas. Mas e se não foi avisada? Como fica a confidencialidade do documento? Eu já peguei uma meia dúzia de textos para traduzir que só vieram ao conhecimento público bem depois da tradução. Imagina se eu repasso e isso cai na boca de quem não deve, como eu fico perante o meu cliente?

Sei não, acho que arrumar cliente hoje é tão difícil, manter também, com tanta oferta de mão de obra... que eu é que não vou me arriscar a perder um numa bobeada dessas.

Embolou o Meio de Campo — Parte 2

Este texto é continuação deste aqui. Melhor ler o outro e os comentários, antes de prosseguir. Um texto breve, que tenho pouco tempo hoje.
Yves Champollion está tratando de resolver o problema de não se poder usar mais o Google Translate como auxiliar do Wordfast. Quando tiver alguma novidade, aviso.
Entretanto, cabe aqui alertar que o Wordfast NÃO envia nossas traduções para o Google Translate. Não tem como. Já achava que não, mas, antes de dizer alguma coisa aqui, perguntei na lista do WF e o próprio Yves me deu a resposta, além do Dominique Pivard, que é outro cara que sabe muito bem das coisas.
De onde é que o Google Translate pega material? Dos alinhamentos que eles fazem de documentos que encontram na Internet. Devem ter um alinhador monstro.
A outra ferramenta de tradução do Google, o Translator Toolkit é outra conversa — e sobre ela falamos outra hora.

domingo, 22 de novembro de 2009

Causo Relampo - Você já Parou para Pensar?

Logo antes do curso sobre títulos de crédito, a turma estava falando da dificuldade que encontravam em distinguir fatura de nota promissória de nota fiscal de duplicata, essas coisas.

Logo no início da aula eu disse "uma nota promissória é só isso: uma nota promissória, uma nota, um bilhete, um escrito, em que se promete alguma coisa, neste caso pagar um determinado valor". Uma das participantes, comentou irritada: "Eu sou uma anta! Conheço o termo há muitos anos e nunca tinha pensado nisso. Preciso aprender a ler com mais cuidado".

O comentário, creio, serve para todos nós. Leia com cuidado, calmamente, que o texto começa a fazer mais sentido.

Obrigado pela vista e volte amanhã.

sábado, 21 de novembro de 2009

Antigamente, os Políticos Sabiam Ler

Você ouviu falar em Bartolomé Mitre? Claro, há uma rua com esse nome em Buenos Aires. Mas o que mais você sabe de don Bartolomé? Eu sabia muito pouco, até ontem, quando, por recomendação de @matthewbennett, no Twitter, fui ler um texto do homem e, depois, fascinado, fui procurar a biografia dele na Wikipedia.

O fato é que ele foi presidente da República Argentina, comandante militar no tempo da Guerra do Paraguai e fundador do La Nación, segundo maior jornal argentino, ainda em mãos de seus descendentes. Morou em cinco países, sempre ativo na política e no jornalismo. Nas horas vagas, foi historiador e — claro! — tradutor. Nosso colega argentino não era pouco ambicioso e atacou de Divina Comédia. Não entendo nem italiano antigo nem espanhol o suficiente para analisar a tradução de Mitre, mas o prefácio, intitulado "Teoría del Traductor"  é muito interessante, mesmo que você não concorde totalmente com a posição do autor.

O texto, como eu o li e de acordo com o encaminhamento do Matthew Bennett, está no blogue do Clube de Traductores Literarios de Buenos Aires. O título do artigo é uma triste verdade: Antes, los políticos sabiam leer, escribir e incluso traducían a los clássicos.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Posta-restante: Perguntas que exigem respostas breves



 Aproveito para responder algumas perguntas que me fizeram.

Anônima pergunta: Faço faculdade de Letras e minha área é a tradução. Entretanto estou confusa sobre como me tornar de fato uma profissional de tradução. Explico: gostaria de saber se depois de formar, ou até mesmo durante o curso, é necessário fazer algum curso extra e como faço para ter uma carteira profissional de tradutor, se é que existe. 

A profissão não é regulamentada e, portanto, qualquer um pode ser tradutor ("qualquer um" inclui até a mim próprio, que não tenho curso de nada e, de título, só tenho o de eleitor). Faça a faculdade para aprender, não para ganhar diploma e, com o tempo, você vai ver que uma faculdade bem feita é uma grande vantagem — ao passo que um diploma bonito pode servir como decoração para sua sala de visitas, mas, profissionalmente, não vale grande coisa.

Carteira de tradutor não existe e, se existisse, não teria muita utilidade. Por outro lado, se você conseguir um emprego de tradutora em uma empresa (como eu já tive), na sua Carteira Profissional vai constar "tradutora". Mas, realmente, pouco adianta. O que adianta é o que você traz dentro da cabeça.

Então, vai aí o conselho que eu sempre dou: Aproveite cada minuto livre de sua vida para estudar a língua estrangeira à qual você vai se dedicar (inglês, espanhol, o que seja). Leia feito uma doida. Tudo! Desde os grandes autores até bula de remédio. Tudo importa para o tradutor. E, para cada minuto que dedicar à língua estrangeira, dedique ao menos dois ao português. A maioria dos aprendizes de tradutor tem um português lamentável e, como profissional, você vai precisar fazer cabriolas incríveis com seu português.

Magda pergunta: Sou formada em letras (licenciatura), estava procurando um curso só para tradutor e encontrei seu blog e você disse que existem cursos livres de tradução, gostaria que você me indicasse algum, pois não consigo encontrar nenhum em São Paulo, apenas universidades com o curso completo de letras e tradução.

O Curso da Associação Alumni está lá bem vivo, Magda. E, ao que dizem, a Ângela Levy ainda mostrando a classe.

Paula pergunta: Devido a essa iniciativa do governo, criei minha pequena empresa. Agora a dúvida é como fazer a nota fiscal, pois o modelo estabelecido pede endereço e como a minha empresa é na minha própria residência, eu não tenho como colocar o endereço daqui.

O endereço da minha empresa também é o da minha residência. Isso não é problema algum. Na minha nota fiscal consta como endereço da firma o endereço da firma, que, coincidentemente, é o endereço da minha residência.

Mariana escreve: Eu estava pesquisando sobre a profissão de tradutor no Google e encontrei o blog de vocês, que me chamou bastante atenção pelas valiosas informações dadas. Primeiramente, gostaria de me apresentar; chamo-me Mariana e estou cursando Direito, encontro-me na metade do curso e não gosto da minha área. Por outro lado, sou apaixonada por línguas - estudei inglês por sete anos, estou aprendendo francês e mais à frente pretendo iniciar o alemão! Foi então lendo um livro da Jane Austen da coleção Penguim Classics, há mais ou menos um mês atrás, que me veio a ideia de ser tradutora. Parece ser o tipo de profissão que junta tudo o que mais amo: leitura, escrita e línguas. No entanto, eu não entendo nada do mercado da tradução e sequer sei por onde começar. Ouço muito falar em pessoas que traduzem artigos avulsos, etc. Mas como se faz para trabalhar na tradução de livros, quais os caminhos a seguir, quais as opções que a profissão oferece? É possível viver bem da atividade de tradução? Talvez sejam perguntas demais, mas peço encarecidamente que respondam.

Mariana, desculpe, mas você está pedindo que eu re-escreva para você, de novo, 50% do que está no blogue e isso eu não posso fazer. Clique aí do lado onde diz "principiantes" e "iniciantes" que aparecem as respostas a todas às suas perguntas.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Edição Extra - Dia da Consciência Negra para Tradutores

Ulisses Wehby de Carvalho nos brinda com uma tradução do mais arrasador e brutal grito contra o preconceito racial que eu conheço. Clique aqui, leia, ouça e, se dentro de você ainda existe algum resquício de preconceito racial, que o choque te limpe a alma.




quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Embolou o meio de campo!

Não dá mais para usar Google Translate com Wordfast. Ai, ai, ai!

Mas o Yves Champollion já disse que vai tomar uma providência.

A ver quem ganha. Aposto nos gauleses.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Você decide: O Repasse




Gostaria de abrir uma discussão, com base em uma história que apareceu outro dia na Web. Vou mascarar nomes (e espero que os comentaristas que conheçam a história não mencionem os nomes), porque gostaria de ver não uma crítica a este ou aquele portal ou tradutor(a), mas sim uma discussão da questão em si. Resumidamente:

  • Existem na Internet vários portais onde se oferecem serviços para tradutores.
  • Nossa colega Alfa entrou no Portal 1 e encontrou uma oferta de serviço, postada por Beta. Candidatou-se e conquistou o serviço.
  • Em seguida, entrou no Portal 2 e descobriu que Beta tinha conquistado o serviço lá, nesse Portal 2, onde tinha sido postado por Gama e que estava recebendo, por ele, aproximadamente três vezes o que estava pagando a Alfa.
  • Tendo tomado conhecimento da situação, Alfa escreveu a Beta e rejeitou o serviço.


Comente à vontade. Principalmente, gostaria de saber se, na sua opinião:

  • Beta tinha direito de repassar o serviço?
  • O fato de que Beta tinha repassado por um terço do que recebia é relevante?
  • Alfa tinha alguma obrigação de rejeitar o serviço?
  • Gama foi lesada?


Terça-feira da semana que vem, comento os comentários. Espero que sejam muitos.


domingo, 15 de novembro de 2009

Ainda a revogação da regulamentção dos TPICs no RJ

Posto, aqui, com algumas alterações, longa mensagem postada na lista trad-prt.
A DELIBERAÇÃO JUCERJA N.º 32 / 2009 DE 06 DE NOVEMBRO DE 2009,diz, no Art. 1º - Revogar a Deliberação JUCERJA n.º 106, de 29 de outubro de 1998, que trata da regulamentação do ofício de Tradutor Público e Intérprete Comercial.
Evidentemente, uma deliberação de Junta Comercial, seja de que UF for, não pode revogar o decreto federal que regula a profissão de tradutor desde os tempos do Getúlio Vargas. Então, o que essa Deliberação revoga? Algumas disposições específicas ao Estado do Rio de Janeiro, tais como número de ofícios e quejandos. Quem era TPIC, continua sendo; quem não era, continua não sendo. A atuação dos TPICs nas outras UFs continua inalterada, já que a JUCERJA tem jurisdição exclusiva sobre o Estado do Rio de Janeiro.
Conferi o site da JUCERJA, as duas resoluções estão lá. A pergunta, é, então, em que isso altera a vida dos TPICs do RJ e dos que prestaram concurso, tenham sido aprovados ou não. É essa a pergunta que gostaria de ver respondida. A resolução revogada, por exemplo, dispõe sobre o número de ofícios para cada língua. Por exemplo, diz que haverá, para o inglês, 120 ofícios. Tendo sido revogada e, ao que eu tenha visto, não tendo sido substituída por outra, pergunta-se, então, quantos ofícios há, agora, para o inglês (e quem diz inglês, diz francês e as outras línguas)? Todos os aprovados serão nomeados? Vão mudar o quantitativo e nomear menos tradutores do que o necessário para chegar a 120? Antes da nomeação, vão escoimar do rol de TPICs os "suspensos" que já morreram? Coisas assim. Há outras perguntas, mas não quero me estender aqui.
Reitero que não sou TPIC e nunca prestei concurso, o que significa que nada ganho nada perco com a situação. Além disso, não faço traduções para serem juramentadas por terceiros. Nossa colega Tamara Barile, há anos, me lembrou que quando a tradução sai do meu computador, eu não sei o que vão fazer dela. Rigorosamente certa está a Tamara. Mas também é rigorosamente certo que, dada a natureza do que faço há anos e o que ganho pelo meu serviço, é de se duvidar que alguém queira juramentar o que traduzi.
Espero ter dirimido as eventuais dúvidas.

Concurso para Tradutor Público ("juramentado) no RJ - desregulamentaram a profissão?

Recebi este comentário durante a noite:
Caros colegas, acabei de descobrir na página da Jucerja que a mesma revogou, com a Deliberação 32/2009 de 6 de novembro (coincidentemente logo após a divulgação dos resultados da prova escrita do concurso) a Deliberação JUCERJA n.º 106, de 29 de outubro de 1998, que trata da regulamentação do ofício de Tradutor Público e Intérprete Comercial. Como interpretam isso? Não se trata de uma nova regulamentação revogando a velha. A regulamentação em si é que foi revogada.

Fui conferir e, e fato, a 32/2009, que se encontra aqui, revoga esta aqui  — sem substituir por nada. Uma coisa muito esquisita, de fato.

Alguém, por favor, me explica como é isso?

Agradeço ao comentarista anônimo e, realmente, do fundo do coração, espero que ele e eu estejamos enganados. Porque, no meu entendimento, desde 29 de outubro de 2009 e até que se publique nova regulamentação, não há regulamentação alguma sobre a profissão de Tradutor Público e Intérprete Comercial no Estado do Rio de Janeiro.

Agradeço muito a quem puder comentar ou agregar alguma informação. É de bons comentários que se faz um blogue útil à coletividade.

sábado, 14 de novembro de 2009

Cliente estrangeiro precisa de nota fiscal ou RPA?

Escreve a M.:

Meu nome é M., 32, e também sou tradutora. Li no seu site as informações sobre as formas de pagamento para quem traduz para o exterior e tenho uma dúvida: eu não emito nota, eu não tenho firma aberta. Caso seja possível trabalhar assim para uma agência no exterior, qual seria a melhor forma de receber o pagamento? Tenho tido dificuldades para encontrar informações, você poderia me ajudar?

Nota fisca e RPA só têm valor e sentido dentro do território Brasileiro. Jamais se enviam essas coisas para empresas estrangeiras. As empresas estrangeiras querem faturas como descrito aqui, embora cada uma delas tenha lá suas exigências e você deve estar preparada para que recusem a sua fatura e peçam uma emendada de acordo com o que eles precisam. Para elas, você é uma pessoa física e acabou. Podem, conforme o caso, pedir que você mande uma cópia de sua Declaração de IR, ou um documento da Receita Federal, declarando que você é contribuinte no Brasil.

Maravilha? De certo modo, sim. Mas trabalhar para agências estrangeiras ou quaisquer clientes no exterior tem três desvantagens:

1. Dada a taxa de câmbio atual, as taxas lá fora andam muito baixas. Há uns três anos, ganhar USD 0,15 por palavra era um sonho. Hoje, é bom, mas também não é essas maravilhas.

2. O risco de calote é muito maior. É muito difícil e caro acionar a lei para ir atrás de uma agência no exterior.

3. Você precisa trazer o dinheiro para cá, o que pode sair caro e demorar. Nem pense em pedir para mandar um cheque para descontar no doleiro da esquina.

E, finalmente, se você pensa que, com isso, se livra dos impostos, está muito enganada.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O Reu Zulu

Estava falando mal da vida dos outros com minha amiga Ana Iaria, que mora na Inglaterra. Falávamos, entre outras coisas, de contaminação linguística, a apropriação indébita de termos e estruturas de uma língua estrangeira. Coisas como "aplicar para uma bolsa de estudos" e quejandos.  Vai além, muito além, dos tais falsos cognatos, para abarcar problemas de sintaxe, como a moça que disse "eu fui oferecida uma tradução" — porque achou que, se "I was offered a translation" era correto, "eu fui oferecida uma tradução" havia de ser também. Ou, ao menos, chique, demonstrando a todos que ela tinha feito intercâmbio, tendo morado em Podunk e tal.

Isso acontece muito em tradução, porque a língua estrangeira está lá presente o tempo todo e muito da formação do tradutor está em aprender a eliminar a contaminação.

Também acontece muito com o pessoal que vive lá fora, como a própria Ana Iaria, que tem que se policiar constantemente, para não trocar o português por anglunhês, como tantos fazem. Ainda outro dia, uma colega que mora nos EUA defendia um anglicismo bobo sob a alegação de que todos os brasileiros residentes lá usam. Achei melhor nem responder.

O curioso é, entretanto, as pessoas que usam essas coisas propositadamente, porque acham chique. É chique, por exemplo, em certas áreas do submundo acadêmico, usar anglicismos para lembrar à patuleia que o autor/locutor participa dos mais altos círculos profissionais, onde a língua é inglês, sendo que português é sabidamente língua de bugres.  A Ana me passou "tamanho dependente", que na verdade seria "dependente do tamanho". Porém a construção à moda inglesa cai de chiqueireza e esfrega no focinho dos que não são "insiders", que o autor ou estudou lá fora ou, ao menos, conhece alguém que estudou ou leu alguma coisa escrita em inglês, coisa assim. Quer dizer, o cara não é pouca porcaria, não! Está pensando o quê?

Se você reclamar, ele vai dizer que é a linguagem habitual da academia — arrastando o teu focinho na areia ainda mais um pouco, para ver se sangra.

A maioria dos caras que escrevem desse jeito sabe pouco inglês e, se soltos no meio dos gringos, faz feio. Outros, até que se viram bem. Mas jamais vão poder ocultar o fato de que são botocudos como nós outros. Lembram um pouco umas caricaturas em que os ingleses ridicularizavam o Rei dos Zulus, no século XIX, onde o potentado africano sempre aparecia descalço, vestindo um calção e depois casaca, gravata e cartola, mas sem camisa. Por mais que se paramentasse com um ou outro adorno europeu, jamais deixava de ser zulu. Não sei se as caricaturas retratavam a realidade, mas devem servir de exemplo para todos nós.